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A aquisição do navio para o Brasil não tem, para as nações europeias o interesse
que deve nos despertar, por vermos assim mal empregados estes 40.000 contos,
com uma unidade que, mesmo dentro do limite do preço, podia ser muitíssimo
mais valiosa;
por vermos provavelmente perdida a hegemonia sul-americana, a
que temos direito, pela importância do país,
embora ela em nada se contraponha
à sólida união que deve existir entre todas as nações do continente, como
determinante de seu prestígio mundial (BRASIL, 1914, p. 58, grifo nosso).
No relatório referente ao ano de 1921, o ministro João Pedro da Veiga Miranda,
argumentando em prol do aumento de verbas para aquisição de equipamento para a Marinha,
ainda nutria pálidas esperanças na recuperação de hegemonia nos mares do sul:
Motivos de força maior nos constrangeram a abdicar
transitoriamente
de nossa
superioridade naval. Resignamo-nos a essa abdicação
transitória
. Suportá-la,
porém como uma
capitis diminutio
definitiva, seria um inqualificável vexame
(BRASIL, 1922, p. 60).
Em 1923, após o retorno pela terceira vez à pasta ministerial, o almirante Alexandrino Faria
de Alencar, em seu relatório referente ao ano de 1922, lamentava que as grandes potências
mundiais já admitissem que o Brasil perdera a hegemonia sul-americana:
Esse fato nos tem levado a situações lamentáveis, quase ofensivas ao brio
nacional como ultimamente nos congressos internacionais, onde, em um deles,
com o intuito, sem dúvida louvável, de se reduzir os armamentos, destinava-se ao
Brasil quota inferior a outra nação do continente. Era a admissão tácita, pelas
grandes potências, de que havíamos perdido a supremacia naval sul-americana,
outrora mantida com justo e orgulhoso garbo pelos nossos antepassados (BRASIL,
1923, p. 7).
Outros exemplos podem ser selecionados nos relatórios do período. Os fragmentos acima,
contudo, bastam para demonstrar que o sentimento da supremacia marítima perdida e a
necessidade de sua recuperação foi perene ao longo da Primeira República. Naturalmente, o
discurso da recuperação da superioridade marítima nacional andava de mãos dadas com o da
imagem do Brasil perante as outras nações. Melhor exemplo pode ser verificado nos debates
ocorridos na Conferência Pan-Americana
4
, quando se discutia a redução de armamentos na América
Latina, após a Primeira Guerra Mundial. Com a palavra, o ministro e almirante Alexandrino:
4. Convém notar que não somente o Brasil se preocupava com a imagem por ocasião da Conferência Pan-Americana.
Todos os países que lhe serviram de sede na América Latina trataram de aumentar o seu poderio naval previamente:
o Brasil em 1906, a Argentina em 1908 e o Chile, em 1923 (DE MARTINI, 2014, p. 323).