Moedas brasileiras de diversas épocas, em litografia incluída no livro Viagem pitoresca, publicado em 1839, de Jean-Baptiste Debret (1768-1848)
Moedas brasileiras de diversas épocas, em litografia incluída no livro Viagem pitoresca, publicado em 1839, de Jean-Baptiste Debret (1768-1848)

O Conselho da Fazenda no Brasil foi criado pelo alvará de 26 de dezembro de 1695, como órgão consultivo encarregado da administração das arrematações dos contratos ligados à exploração comercial e arrecadação de tributos. Instalado em Salvador em 3 de abril de 1696, era composto pelo governador-geral, provedor-mor, juiz dos feitos da Fazenda, procurador da Fazenda e dois desembargadores dos agravos mais antigos da Relação da Bahia.

Uma das características da administração fazendária portuguesa na América foi a adoção do monopólio régio, também chamado de estanco, sobre algumas atividades econômicas ou sobre direitos e tributos, bem como a permissão do arrendamento de alguns desses por particulares. Os contratos de exploração, comércio ou trato de mercadorias, e os de cobrança de tributos ou rendas reais tornaram-se, desse modo, responsáveis pelo desenvolvimento do sistema financeiro de Portugal e pela sustentação da própria máquina administrativa, sendo concedidos em todas as suas colônias (Antezana, 2006, p. 75).

Em geral, os contratos eram acordos temporários, com prazos e quantias fixados, e direitos e deveres predefinidos a serem cumpridos pelas partes. O primeiro contrato estabelecido na América foi o da exploração do pau-brasil, arrendado pelo comerciante Fernando de Noronha, ou Loronha, em 1501. Posteriormente, seguiram-se outros, referentes ao sal, ao tabaco, à pesca da baleia, aos diamantes e à cobrança de direitos como os dízimos e as dízimas arrecadadas pela alfândega, e tributos como os registros de passagens.

A princípio, a fiscalização e cobrança dos direitos régios aos rendeiros ficou a cargo dos almoxarifes, criados em 1501. Em 1548, eles passaram a integrar a estrutura das recém-criadas provedorias da Fazenda, cabendo aos provedores das capitanias pôr em pregão as rendas e direitos, remetendo o registro das arrematações ao provedor-mor.

Pouco depois, em 1591, durante o período em que a Coroa portuguesa esteve unida à Espanha sob a chamada União Ibérica (1580-1640), foi criado em Portugal o Conselho da Fazenda, dotado de amplas atribuições e encarregado da administração das rendas e direitos, bem como da fiscalização dos livros de contratos. Sua capacidade de atuação em matérias fazendárias manteve-se mesmo quando, após a restauração portuguesa, foi instalado o Conselho Ultramarino, em 14 de julho de 1642, dotado de uma variada gama de competências relacionadas aos domínios coloniais (Salgado, 1985, p. 43).

No Brasil, o Conselho da Fazenda foi criado em 1695, e o registro de sua primeira reunião, datado de 3 de abril de 1696, afirma que sua função era tratar de todas as matérias da Fazenda, excetuando as causas que corressem perante o provedor-mor, devendo dar apelação e agravo ao Conselho Ultramarino. Outros documentos relacionados aos seus primeiros anos permitem observar que o órgão desempenhou um importante papel na administração fazendária, cabendo-lhe tratar de questões variadas, como a tomada das fazendas das naus que aportavam, o acompanhamento do rendimento das dízimas da alfândega, o modo mais adequado do despacho do tabaco, a administração das minas de ouro descobertas no Espírito Santo, a arrematação do contrato de aguardentes e vinhos de mel, e a avaliação da arrecadação dos direitos reais. Em alguns casos, competiu ao Conselho de Fazenda prestar auxílio, por conta da Fazenda Real, às tropas portuguesas na África e na própria colônia americana (Biblioteca Nacional, 1944).

No século XVIII, a partir da atuação do marquês de Pombal (1750-1777), foram iniciadas reformas administrativas de impacto em Portugal e na colônia, que buscavam a recuperação econômica do Reino. Dentre as medidas mais significativas estiveram o estabelecimento de Juntas da Real Fazenda, a partir de 1760, subordinadas diretamente ao Erário Régio, em substituição às antigas provedorias. As juntas foram responsáveis por implementar a renovação dos métodos contábeis na colônia, tendo ainda como competência reger as arrematações dos contratos, administrar os rendimentos e as folhas de despesas das capitanias. Além disso, a administração das atividades ligadas à exploração do ouro e diamantes foi reformulada e foram criados diferentes órgãos com a finalidade de estimular a produção e comércio de alguns gêneros agrícolas.

Nesse contexto, em 31 de março de 1769, o Conselho da Fazenda foi extinto. Logo em seguida, o alvará de 3 de março de 1770 reestruturaria a administração fazendária da colônia, extinguindo o cargo de provedor-mor, que teria suas competências absorvidas pelas Juntas da Real Fazenda e intendências da Marinha e Armazéns criadas na Bahia. Posteriormente, com a vinda da corte portuguesa para o Brasil, em 1808, um novo Conselho da Fazenda foi criado, como parte dos esforços da Coroa de adaptar a estrutura administrativa brasileira às necessidades que se impunham após a mudança do centro de decisão política do Reino para o Rio de Janeiro.

 

Angélica Ricci Camargo
Maio 2013

 

Fontes e bibliografia
ANTEZANA, Sofia Lorena Vargas. Os contratadores dos caminhos do ouro das minas setecentistas: estratégias mercantis, relações de poder, compadrio e sociabilidade (1718-1750). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006. BIBLIOTECA NACIONAL. Documentos Históricos. Rio de Janeiro, 1944, v. 64 e 65.

GUIMARÃES, Carlos Gabriel; PESAVENTO, Fábio. Os contratadores e os contratos do Rio de Janeiro colonial, 1769-1779: estudo de uma sociedade mercantil. Disponível em: https://bit.ly/2m7TEUB. Acesso: 21 jan. 2009.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. Processo administrativo ibero-americano: aspectos socioeconômicos – período colonial. São Paulo: Biblioteca do Exército, 1962.

MADEIRA, Mauro de Albuquerque. Letrados, fidalgos e contratadores de tributos no Brasil colonial. Brasília: Coopermídia, Unafisco/Sindifisco, 1993.

PRIMEIRO assento que se tomou em Conselho da Fazenda, em que se dá forma do que se deve nele observar e guardar. In: BIBLIOTECA NACIONAL. Documentos Históricos. Rio de Janeiro, 1944, v, 64, p. 305-307.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

 

Referência da imagem
Jean Baptiste Debret. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l‘avénement et de I‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834-1839. Arquivo Nacional, OR_1909_V2_PL31