O Conselho de Procuradores-Gerais das Províncias do Brasil foi criado após o regresso de d. João VI para Portugal, pelo príncipe regente, d. Pedro, por meio do decreto de 16 de fevereiro de 1822. Presidido pelo próprio príncipe e composto por representantes de cada província e por todos os ministros e secretários de Estado, o conselho tinha como competências aconselhar o príncipe, sempre que solicitado, nos negócios mais importantes e difíceis; examinar os grandes projetos de reforma que deviam ser feitos na administração geral e particular do Estado; propor as medidas para o bem do Reino Unido e prosperidade do Brasil; e zelar pelas províncias.
A instituição do Conselho de Procuradores-Gerais foi uma das medidas estabelecidas por d. Pedro como resposta às determinações das Cortes portuguesas, que desde o início da Revolução do Porto, em 1820, tentavam limitar a autonomia adquirida pela colônia após a vinda da corte em 1808. Tais tentativas recrudesceram após a decisão de permanência do príncipe regente no Brasil, em janeiro de 1822.
Com a convocação de representantes de todas as províncias para o conselho, d. Pedro tentava contornar os efeitos da criação, a partir de 1821, das Juntas Provisórias de Governo nas províncias em substituição aos governadores, subordinadas diretamente a Portugal, e dotadas de autoridade e jurisdição na parte civil, econômica, administrativa e de polícia. Visava, ainda, obter a adesão das províncias à causa do príncipe regente, dado que muitas delas, como Bahia, Maranhão e Pará, ainda eram fiéis a Portugal, seguindo uma política gradualista, proposta por José Bonifácio, de preparar o Brasil para a independência e para a monarquia constitucional (Rodrigues, 1973).
Pelo decreto de 16 de fevereiro de 1822, d. Pedro estabeleceu que os procuradores fossem nomeados pelos eleitores de paróquia nas cabeças de comarcas. Para as províncias que tinham quatro deputados nas Cortes, seria nomeado um procurador, para aquelas que possuíam de quatro a oito, seriam nomeados dois e para as que tinham mais de oito, seriam nomeados três. O conselho se reuniria em uma sala do Paço sempre que fosse convocado. Além dos representantes das províncias, os secretários e ministros também teriam assento e voto. Dentre os membros, um seria escolhido, a cada mês, para a função de vice-presidente. Contaria ainda com um secretário, encarregado de fazer o protocolo das sessões e de redigir os projetos aprovados e as decisões tomadas.
O Conselho dos Procuradores-Gerais das Províncias foi formado aos poucos, à medida que a adesão provincial elegia e enviava cada representante. Tomaram assento no Conselho, como ministros e secretários, José Bonifácio de Andrada e Silva, da pasta do Reino e Estrangeiros; Caetano Pinto de Miranda Montenegro, da Justiça; Martim Francisco Ribeiro de Andrada, ministro da Justiça; Joaquim de Oliveira Álvares, Luís Pereira da Nóbrega de Sousa Coutinho e João Vieira de Carvalho, ministros da Guerra; Manuel Antônio de Farinha, conde de Souzel e Luís da Cunha Moreira, ministros da Marinha. Os representantes das províncias foram José Joaquim Carneiro de Campos, Manuel Jacinto Nogueira da Gama, d. Lucas José Obes, José Mariano de Azeredo Coutinho, Joaquim Gonçalves Ledo, José de Oliveira Pinto Botelho Mosqueira, Estevão Ribeiro de Resende, José Vieira de Matos, Joaquim Xavier Curado, Antônio Rodrigues Veloso de Oliveira, cônego Antônio Vieira da Soledade, Manuel Ferreira da Câmara Bittencourt e Sá, Manuel Clemente Cavalcanti de Albuquerque, João José de Guimarães Silva, padre Manuel Rodrigues Jardim, entre outros (Rodrigues, 1973).
Dentre os assuntos debatidos no conselho, segundo suas atas, estiveram os problemas de defesa, de segurança externa e interna, as crises políticas e financeiras, as relações com Portugal, a liberdade de imprensa, as eleições, , a anistia aos dissidentes políticos, a ampliação do apoio provincial a d. Pedro, o problema indígena e a educação (Rodrigues, 1973).
A decisão n. 53, de 27 de maio de 1822, especificou o decreto de 16 de fevereiro, definindo que ao conselho não cabia a elaboração de leis, atribuição exclusiva das Cortes portuguesas, mas apenas o julgamento daquelas feitas em Lisboa. Complementava, dessa forma, outras medidas restritivas, como a decisão n. 40, de 4 de maio daquele ano, que mandou que não se executasse nenhum decreto das Cortes sem o “cumpra-se” de d. Pedro.
Na reunião do conselho de 2 de junho de 1822, o príncipe d. Pedro alterou o nome do Conselho de Procuradores para Conselho de Estado e recebeu várias representações sobre a necessidade de convocação de uma Assembleia Geral Constituinte e Legislativa, que de fato foi realizada pelo decreto de 3 de junho, dando assim um passo decisivo para o processo de independência do país. Depois da convocação do Conselho e da Assembleia, foram tomadas outras medidas visando à autonomia política definitiva do Brasil em relação às Cortes portuguesas. Em 21 de junho, a decisão n. 60 determinou que todos os pretendentes a empregos públicos aderissem à causa de união e independência e, em 5 de agosto, os governos provinciais foram recomendados a não receber os empregados despachados de Portugal.
Essas notícias levaram as Cortes portuguesas a adotar medidas extremas. No final de agosto, chegaram ao Brasil ordens reduzindo o príncipe a um delegado temporário das Cortes, com secretários de Estado nomeados em Lisboa, e circunscrevendo sua autoridade às províncias em que ela se exercia de fato, além de anular a convocação do Conselho de Procuradores e mandar processar aqueles que houvessem procedido contra a política da assembleia constituinte portuguesa (Costa, 1987, p. 48).
Na sessão do conselho de 2 de setembro, presidida por d. Leopoldina, foi tomada a decisão de enviar um correio a d. Pedro, que se encontrava na província de São Paulo, pedindo providências imediatas em relação às ordens vindas de Portugal, do que resultou a declaração da independência do Brasil, realizada pelo príncipe no dia 7 daquele mês.O conselho foi extinto em 20 de outubro de 1823, após a formação de uma assembleia constituinte, composta por deputados de todas as províncias, para a elaboração de uma Constituição. Em 13 de novembro, um dia depois de dissolvida a assembleia, foi criado um Conselho de Estado, composto pelos ministros de Estado, um desembargador do Paço e conselheiros da Fazenda.
Angélica Ricci Camargo
Mar. 2012
Fontes e bibliografia
BRASIL. Decreto de 16 de fevereiro de 1822. Cria o Conselho de Procuradores-Gerais das Províncias do Brasil. Coleção das leis do Império do Brasil, Rio de Janeiro, parte 2, p. 6-8, 1887.
______. Decisão n. 53, de 27 de maio de 1822. Explica o decreto de 16 de fevereiro deste ano que criou um Conselho de Procuradores-Gerais das Províncias do Brasil. Coleção das decisões do governo do Império do Brasil, Rio de Janeiro, p. 39-40, 1887.
______. Decisão n. 40, de 4 de maio de 1822. Determina que não se dê execução a nenhum decreto das Cortes Portuguesas sem que tenha o cumpra-se de Sua Alteza Real. Coleção das decisões do governo do Império do Brasil, Rio de Janeiro, p. 32, 1887.
COSTA, Emília Viotti da. Da monarquia à república: momentos decisivos. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
RODRIGUES, José Honório (coord.). Atas do Conselho de Estado: obra comemorativa do sesquicentenário da Instituição Parlamentar, v. 1. Brasília: Senado Federal, 1973.
SOUZA, Iara Lis Carvalho. Pátria coroada: o Brasil como corpo político autônomo (1780-1831). São Paulo: Fundação Editora da Unesp, 1999.
Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_1R Conselho de Estado
BR_RJANRIO_22 Decretos do Executivo - Período Imperial
Referência da imagem
Jean Baptiste Debret. Voyage pittoresque et historique au Brésil, ou Séjour d’un Artiste Français au Brésil, depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement, epoques de l‘avénement et de I‘abdication de S.M. D. Pedro 1er. Paris: Firmind Didot Frères, 1834-1839. Arquivo Nacional, OR_1909_V3_PL18