O cargo de tesoureiro, também chamado tesoureiro-geral, foi criado em 17 de dezembro de 1548, no contexto das reformas que buscavam a centralização das atividades administrativas na colônia. Nesse sentido, foram implantados mecanismos que buscavam aumentar o controle e a fiscalização das atividades de produção, de comércio e de recolhimento dos direitos e rendas reais, como as Alfândegas e as provedorias de Fazenda nas capitanias, além dos cargos de Provedor-mor, de Contador-geral, de juiz da Fazenda e de Tesoureiro.
No princípio da colonização portuguesa da América, as atividades fazendárias reais ficavam na esfera de atuação dos cargos de almoxarife e feitor, criados por volta de 1501. Essa estrutura permaneceria sem alterações após a distribuição das capitanias hereditárias, em 1534, somente se modificando em 1548, quando se instalaram o governador-geral e outros cargos destinados à administração fazendária e da Justiça.
Não se conhece nenhuma regulamentação específica para o cargo de tesoureiro, embora o regimento do provedor-mor de 1548 mencione a existência de um regimento próprio dispondo sobre suas atribuições. De acordo com esse ato, as atividades do tesoureiro se concentravam no recebimento anual dos rendimentos das rendas e direitos arrecadados em cada provedoria de capitania.
O regimento dado ao governador-geral Francisco Giraldes, de 5 de março de 1588, conferiu ao tesoureiro as atribuições de dar conhecimento, ao almoxarife da capitania da Bahia, da provisão de armamento e do preço pago pelas armas, e de efetuar o pagamento dos soldos a pessoas que servissem nos combates aos corsários, cujo registro deveria ser realizado pelo seu escrivão.
No contexto das guerras contra os holandeses que ocupavam a capitania de Pernambuco, o tesoureiro, assim como outros cargos da administração colonial, foi dotado de competências específicas relacionadas à situação. De acordo com o regimento mandado ao conde da Torre, dom Fernando Mascarenhas, de 13 de agosto de 1638, o tesoureiro deveria servir como pagador-geral das tropas, ficando responsável pelo recebimento, registro e cobrança dos materiais e dinheiro, advindos dos contratos realizados em Lisboa e enviados pelo rei para o pagamento das tropas. Além disso, possuiria uma das três chaves da arca onde se guardariam os valores arrecadados e o livro da receita e despesa – as outras duas ficariam com o provedor-mor e com o capitão-geral.
O regimento dado ao governador-geral Roque da Costa Barreto, de 23 de janeiro de 1677, determinava que o tesoureiro deveria lançar em receita as penas pecuniárias relativas às condenações dos moradores que faltassem aos exercícios previstos no regimento das ordenanças, que seriam reservadas para a compra de armas e munições para a guarnição da praça da Bahia. Competiria também ao tesoureiro o registro da venda das armas dos armazéns que não fossem necessárias à defesa da cidade, e das mercês feitas pelo governador-geral que, depois, deveriam ser enviadas ao rei.
De acordo com o regimento dado ao provedor-mor da Fazenda do Estado do Brasil, de 31 de outubro de 1752, referente à administração das despesas relacionadas ao desembarque das naus de comboio ou guarda-costas, ficava a cargo do tesoureiro lançar em receita, depois de recolhidos no armazém, os mantimentos vendidos que se encontravam entre aqueles declarados incapazes de retornarem às naus. Também era de sua responsabilidade o pagamento das mercadorias compradas para as naus, dos socorros necessitados pelos oficiais, gente do mar, artilheiros e soldados, e de seus soldos e salários.
Nenhum dos atos deixa claro se o tesoureiro possuía vínculo de subordinação com o provedor-mor, que era a autoridade máxima referente à administração fazendária na colônia, ou com qualquer outro cargo ou órgão, mesmo localizado em Portugal. Contudo, em várias ocasiões, há a indicação de que o tesoureiro tinha que enviar seus registros diretamente ao rei.
No alvará de 3 de março de 1770, que reformulou a administração fazendária, abolindo o cargo de provedor-mor e criando uma junta de Fazenda na Bahia, o cargo de tesoureiro não é mais citado, assim como na legislação posterior a 1808.
Angélica Ricci Camargo
Dez. 2013
Fontes e bibliografia
ALVARÁ de 3 de março de 1770. Cria o cargo do intendente da Marinha do Arsenal da Bahia, dando procedimentos para a administração fazendária da colônia, e definindo as atribuições da Junta da Administração da Fazenda na mesma capitania, que o intendente da Marinha integrava como ministro. In: LEIVAS, Cláudio Pereira; SCAVARDA, Levy. História da Intendência da Marinha. Rio de Janeiro: Diretoria da Intendência da Marinha, 1972. p. 221-225.
REGIMENTO de Antônio Cardoso de Barros, provedor-mor da Fazenda, de 17 de dezembro de 1548. In: TAPAJÓS, Vicente. A política administrativa de d. João III. 2. ed. Rio de Janeiro: Departamento Administrativo do Serviço Público/Serviço de Documentação, 1966. p. 271-278.
REGIMENTO de Francisco Giraldes, de 8 de março de 1588. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972. p. 253-277.
REGIMENTO de Roque da Costa Barreto dos governadores-gerais, de 16 de janeiro de 1677. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 2. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972. p. 745-846.
REGIMENTO para o provedor-mor da Fazenda do Estado do Brasil, de 31 de outubro de 1752. Arquivo Nacional, Fundo Relação da Bahia, códice 539, v. 3, f. 110-116.
SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
Referência da imagem
Sir Henry Chamberlain. Vistas e costumes da cidade e arredores do Rio de Janeiro em 1819-1820. Rio de Janeiro: Kosmos, 1943. Arquivo Nacional, OR_1985