A Escola de Minas de Ouro Preto, inaugurada em 12 de outubro de 1876, foi instituída pelo decreto n. 6.026, de 6 de novembro de 1875, com o objetivo de “preparar engenheiros para a exploração das minas e para os estabelecimentos metalúrgicos” (BRASIL, 1876, p. 701). A ideia de fundar uma escola nesses moldes remete à Assembleia Nacional Constituinte de 1823, quando os deputados discutiram a implantação de universidades no Estado recém-independente. Nessa ocasião foi sugerida a criação de uma academia montanística, onde deveriam ser ensinadas disciplinas relacionadas à metalurgia, mineralogia, construção de minas, agricultura e veterinária. Com a dissolução da Assembleia em 12 de novembro de 1823, no entanto, o projeto não foi adiante (MOACYR, 1936, p. 108).
A proposta de implantação da academia montanística está relacionada às influências do pragmatismo e do cientificismo da ilustração portuguesa, que visava a racionalização e a modernização econômica através de investimentos em instituições educacionais e científicas. Em 1832, sob pressão do Conselho-Geral da província Minas Gerais, onde não havia sido criado nenhum curso superior, foi promulgado o decreto de 3 de outubro, estabelecendo ali um Curso de Estudos Mineralógicos. Tal medida, entretanto, não foi implementada neste momento (CARVALHO, 2002, p. 20-25).
Na segunda metade do século, diversas reformas organizacionais no aparato burocrático do Estado buscaram uma maior modernização das práticas administrativas. A Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas foi criada em 1860 para melhor administração dos negócios agrícolas, comerciais, industriais e científicos, dentre outros. O desenvolvimento das ciências tornou-se um elemento importante, não só pelos aspectos econômicos, mas também como elemento legitimador da civilização. As Faculdades de Medicina e o Observatório Astronômico foram reformados, diversos museus foram criados nas províncias e o Museu Nacional foi reestruturado em 1876, mesmo ano em que a Escola de Minas foi inaugurada.
A criação da escola é atribuída a uma iniciativa pessoal de d. Pedro II, um admirador das ciências e das artes que visava a formação de uma cultura brasileira de caráter civilizado, patrocinando diversos projetos e instituições nessas áreas, como o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. O imperador foi mecenas de cientistas, naturalistas, geólogos, botânicos, cartógrafos, advogados, médicos, professores, pintores, dentre outros profissionais. Essas iniciativas consolidaram uma imagem de um monarca ilustrado e sábio, que, além de patrocinar projetos artísticos e científicos, também participava de sociedades desses gêneros no exterior (SCHWARCZ, 1998, p. 129-130).
Na sua temporada na Europa entre 1871 e 1872, d. Pedro II entrou em contato com Auguste Daubrée, seu colega na Academia de Ciências de Paris e diretor da Escola de Minas francesa, solicitando-lhe orientações sobre maneiras de conhecer e explorar as riquezas minerais brasileiras. O cientista sugeriu a elaboração da carta geológica e o ensino da geologia no país, sendo convidado pelo imperador para visitar o Brasil. Não podendo atender ao convite, indicou Claude Henri Gorceix, que assinou um contrato em Paris em 28 de março de 1874 para organizar o ensino de mineralogia e geologia no Rio de Janeiro. Gorceix, montou um laboratório especializado nessas disciplinas na Corte e, no final do ano de 1874, viajou para a província de Minas Gerais para escolher a melhor localização para a fundação da escola, tendo escolhido Ouro Preto para sua instalação (CARVALHO, 2002, p. 33-37).
Em 6 de novembro do ano seguinte, foi publicado o regulamento que instituiu a Escola de Minas, subordinada à Secretaria de Estado dos Negócios do Império. A escola passou a funcionar no prédio que abrigava a Câmara Municipal e os livros e materiais de laboratório, em sua maioria, foram importados da França (BRASIL, 1877, p. 36). O curso tinha duração de dois anos, era gratuito e admitia dez alunos para o ingresso no primeiro ano, através de um concurso de admissão. A idade mínima para a matricula era de18 anos completos. No primeiro ano, os alunos estudariam física, química geral, mineralogia, exploração das minas, noções de topografia, levantamento de planos das minas, trigonometria esférica, geometria analítica, complementos de álgebra, mecânica, geometria descritiva, trabalhos gráficos e desenho de imitação. Deveriam ainda realizar trabalhos práticos como manipulações de química, determinação prática dos minerais e excursões mineralógicas. No segundo ano, as matérias ministradas eram geologia, química dos metais e docimasia, metalurgia, preparação mecânica dos minérios, mecânica, estudo das máquinas, construção, estereotomia, madeiramento, trabalhos gráficos e legislação das minas. Na parte prática, teriam que realizar ensaios metalúrgicos, manipulações de química, explorações geológicas e visitas a fábricas. Ao final do curso, o estudante obteria o título de engenheiro de minas (BRASIL, 1876, p. 701).
Os quadros da escola seriam compostos por um diretor e por professores de mineralogia e geologia, de exploração das minas e metalurgia e de mecânica e construção, além de um adjunto para o ensino do desenho e da geometria descritiva, dois repetidores-preparadores, um secretário, que seria também bibliotecário, quatro serventes, um deles na função de porteiro, e um professor coadjuvante, nomeado pelo ministro, para ensinar a legislação das minas.
Gorceix, em seus diversos relatórios, elencou as principais razões para o baixo número de alunos, citando o rigor do concurso de admissão, que eliminava muitos concorrentes, as dificuldades de preparação para o concurso, devido à situação do ensino no país, as incertezas quanto à sobrevivência da Escola, geradas pelos ataques que sofria de opositores ao projeto, dificuldades que encontravam os discentes em achar emprego depois de formados e, também, o isolamento de Ouro Preto, que dificultava a vinda de estudantes e professores. Tais dificuldades obrigaram a instituição a passar por diversas adaptações na sua estrutura e currículo, dentre elas, a criação, em 1877, pela portaria n. 372, da Secretaria de Estado dos Negócios do Império, de um curso preparatório para quem desejasse prestar os exames de admissão na escola, com duração de um ano (CARVALHO, 2002, p. 45).
Em 1882 um novo regulamento, instituído pelo decreto n. 8.727, de 4 de novembro, ampliou a carga horária do curso. O preparatório passou a ter duração de dois anos, e o curso superior, três. As disciplinas ministradas continuaram praticamente as mesmas, porém com uma nova divisão entre os três anos letivos. Pouco depois, o decreto n. 9.448, de 27 de junho de 1885, deu outro regulamento à Escola de Minas. O curso preparatório, que passou a ser denominado curso geral, teve sua duração aumentada para três anos, mesmo tempo que o curso superior. Os alunos que concluíssem os dois primeiros anos do curso geral passariam a receber o título de agrimensor. Já o título de engenheiro de minas passou a gozar dos mesmos direitos e regalias que os engenheiros civis, o que possibilitava aos alunos ampliar oportunidades de trabalho. É possível observar nesse ato uma considerável ampliação das disciplinas ministradas em ambos os cursos, e também um aumento do número de professores e funcionários. Esse regulamento vigorou até o início da República, quando o decreto n. 1.258, de 10 de janeiro de 1891, estabeleceu uma nova reforma.
Louise Gabler
27 out. 2014
Bibliografia
BRASIL. Decreto n. 6.026, de 6 de novembro de 1875. Cria uma Escola de Minas na Província de Minas Gerais e dá-lhe Regulamento. Coleção das leis do Império do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, parte 2, p. 701, 1876.
____. Decisão n. 372. Império. Portaria de 12 de setembro de 1877. Manda observar as Instruções relativas ao Curso preparatório estabelecido provisoriamente na Escola de Minas de Ouro Preto. Coleção das decisões do governo do Império do Brasil. Rio de Janeiro, 1877.
____. Decreto n. 8.727, de 4 de Novembro de 1882. Manda observar o Regulamento da Escola de Minas. Coleção das leis do Império do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 392, 1883.
____. Relatório do ano de 1886 apresentado à Assembleia Legislativa na 1ª seção da 16ª legislatura, pelo ministro e secretário dos Negócios do Império e conselheiro de Estado Dr. José Bento da Cunha Figueiredo. Rio de Janeiro: Tipografia Nacional, 1877.
____. Decreto n. 9.448, de 27 de junho de 1885. Dá novo regulamento à Escola de Minas. Coleção das leis do Império do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 484, 1886.
____. Decreto n. 346, de 19 de abril de 1890. Cria a Secretaria de Estado dos Negócios da Instrução Pública, Correios e Telégrafos. Decretos do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, quarto fascículo, p. 641-642, 1890.
____. Decreto n. 377-A, de 5 de maio de 1890. Organiza a Secretaria dos Negócios da Instrução Pública, Correios e Telégrafos. Decretos do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, quinto fascículo, p. 207, 1898.
____. Decreto n. 1.258, de 10 de janeiro de 1891. Aprova o regulamento da Escola de Minas. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 3, p. 149-174, 1891.
____. Lei n. 23, de 30 de outubro de 1891. Reorganiza os serviços da administração federal. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, parte 1, p. 42-45, 1892.
____. Decreto n. 1.159, de 3 de dezembro de 1892. Aprova o código das disposições comuns às instituições de ensino superior dependentes do Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, p. 961, 1892.
____. Decreto n. 1.546, de 18 de setembro de 1893. Aprova o regulamento para a Escola de Minas. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, parte 2, p. 630-648, 1893.
CARVALHO, José Murilo de. A Escola de Minas de Ouro Preto: o peso da gloria. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002.
LOPES, Maria Margareth. O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus e as ciências naturais no século XIX. São Paulo: Hucitec, 2009.
MOACYR, Primitivo. A instrução e o império: subsídios para a história da educação no Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1936. v1. (Biblioteca pedagógica brasileira, Série 5, Brasiliana, v.66, 87, 121).
SCHWARCZ, Lilia Moritz. As barbas do Imperador: D. Pedro II, um monarca nos Trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR AN,RIO 22 – Decretos do Executivo – Período Imperial
BR AN,RIO 23 – Decretos do Executivo – Período Republicano
BR AN,RIO 95 – Série Educação – Ensino Superior (IE3)
Referência da imagem
Arquivo Nacional. Fundo Afonso Pena Júnior. BR_RJANRIO_OO_0_FOT_3
Este verbete refere-se apenas à trajetória do órgão no período imperial. Para informações entre 1889-1930, consulte o verbete Escola de Minas [de Ouro Preto].