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Campos de demonstração

Publicado: Quinta, 08 de Abril de 2021, 10h10 | Última atualização em Quarta, 14 de Setembro de 2022, 12h02 | Acessos: 2991
Plantação de trigo tartárico, Núcleo Colonial Vera Guarani, Paraná, 1910. Fotografia de Amador E. Saporski
Plantação de trigo tartárico, Núcleo Colonial Vera Guarani, Paraná, 1910. Fotografia de Amador E. Saporski

Os campos de demonstração foram instituídos pelo decreto n. 8.319, de 20 de outubro de 1910, com a finalidade de divulgar conhecimentos práticos, visando ao aumento da produção agrícola. Previstos no decreto n. 7.556, de 16 de setembro de 1909, que criou o Serviço de Inspeção Agrícola, ao qual cabia sua fiscalização, os campos foram regulamentados no ano seguinte pelo ato que organizou o ensino agronômico. Suas atividades abrangiam o estudo das culturas locais, incluindo a análise das terras e de sua exploração mediante instrumentos aperfeiçoados, e a pesquisa de plantas e de animais úteis para o desenvolvimento da agricultura e da pecuária do país (Brasil, 1913, p. 1.097-1.098).

A questão da mão de obra ocupou um espaço importante na pauta política dos governos da Primeira República, tanto no que se refere aos serviços de imigração, como na incorporação dos chamados ‘trabalhadores nacionais’ no processo produtivo e sua qualificação “nos domínios da eficiência produtiva e do progresso” (Mendonça, 1997, p. 94). O aprimoramento almejado, que colocaria o país “em pé de igualdade com as nações civilizadas” (Oliveira, 2004, p. 136), pressupunha a existência de instituições de ensino capazes de difundir conhecimentos científicos modernos, contribuindo, portanto, para a superação do propagado atraso que caracterizava a agricultura brasileira.

O decreto n. 8.319 organizou o ensino agronômico na esfera do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, que foi estabelecido, em 1906, como uma resposta às demandas de grupos agrários distantes do centro de poder. Capitaneados pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), os debates em defesa de uma pasta específica para a área, relegada a  segundo plano no Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, traziam temas como a necessidade de modernização e de diversificação da produção, que se tornaram os principais eixos da ação ministerial a partir de 1909 (Mendonça, 1997, p. 17; 95; 115). Nesse sentido, o ensino constituiu-se um objeto privilegiado, por meio da estruturação de uma rede complexa, que compreendia escolas de nível superior, médias ou teórico-práticas, aprendizados agrícolas, cursos ambulantes e serviços complementares, como as estações experimentais e os campos de demonstração. Tais instituições foram inspiradas em modelos estrangeiros, principalmente dos Estados Unidos, anteriormente ensaiados no estado de São Paulo, onde escolas práticas e campos de demonstração e de experiências foram criados pela lei n. 678, de 13 de setembro de 1899.

De acordo com o decreto n. 8.319, de 20 de outubro de 1910, os campos de demonstração seriam compostos pelo diretor e chefe de culturas, auxiliares e trabalhadores que se fizessem necessários. Os campos não integrados a outro estabelecimento de ensino deveriam contar com um laboratório especializado em química agrícola, instalações para bonificação dos produtos de suas culturas, uma galeria de máquinas, entre outras dependências. A organização desses campos autônomos ficaria a cargo dos professores ambulantes, cabendo aos professores especiais e aos inspetores do Serviço de Inspeção Agrícola e seus ajudantes a montagem dos campos dentro de sua jurisdição. O decreto n. 8.319 ainda dispôs sobre a possibilidade de fundação de campos em propriedades particulares, com a anuência do ministro, competindo ao interessado o fornecimento do terreno, animais e mão de obra.

Nos campos de demonstração seriam admitidos aprendizes de 15 a 18 anos de idade, os quais receberiam uma diária correspondente aos serviços prestados. Para os trabalhos, o governo forneceria sementes selecionadas, adubos e corretivos, instrumentos e utensílios. Em 1911, o decreto n. 8.768, de 7 de junho, regulamentou os campos de demonstração, preservando suas competências e definindo-os como “centros de propaganda a favor da agricultura, das indústrias rurais e dos princípios de mutualidade e cooperação agrícola” (Brasil, 1915, p. 1.098). Além do diretor e do chefe de culturas, os campos deveriam ser formados por um feitor perito no manejo de máquinas, um tratador de animais, um servente e outros trabalhadores. Segundo o decreto, o diretor do campo exerceria, cumulativamente e sem outra remuneração, o cargo de professor ambulante na área de sua jurisdição.

Os primeiros campos foram estabelecidos ainda em 1911, caso dos campos de Espírito Santo, na Paraíba, pelo decreto n. 8.792; de Lavras, em Minas Gerais, pelo decreto n. 8.936; de Xiririca, em São Paulo, pelo decreto n. 9.129; e de Macaíba, no Rio Grande do Norte, pelo decreto n. 8.786. No ano seguinte, criaram-se os campos de São Cristóvão, em Sergipe, pelo decreto n. 9.334; de Itajaí, em Santa Catarina, pelo decreto n. 9.410; e de Itaocara e Resende, no Rio de Janeiro, pelos decretos n. 9.536 e 9.758, respectivamente.

O decreto n. 11.519, de 10 de março de 1915, que reorganizou o Serviço de Inspeção e Fomento Agrícolas, integrou os campos de demonstração à sua estrutura. O ato alterou a composição desses órgãos, que passaram a ser formados pelo administrador, um arador, um carpinteiro, um ferreiro e dez aprendizes. Para a admissão destes últimos, foram preceituados requisitos, tais como o atestado de comportamento passado pela autoridade policial, a idade mínima de 15 anos e o gozo de boas condições de saúde.

De acordo com o decreto, ficaram mantidos os campos de demonstração de Macaíba, Espírito Santo, Itacoara, Itajaí e Lavras, e foram transformados em estabelecimentos dessa natureza a Fazenda Experimental de Deodoro, no Distrito Federal, e a Fazenda de Sementes, no estado do Rio de Janeiro.

Em 1916, o decreto n. 11.998, de 22 de março, deu novo regulamento ao Serviço de Inspeção e Fomento Agrícolas, que alterou sua denominação para Serviço de Agricultura Prática e promoveu modificações na estrutura dos campos, que passaram a contar com um chefe de culturas ou ajudante do inspetor agrícola, um instrutor agrícola e os trabalhadores que se fizessem necessários. O ato também incumbiu as estações experimentais da fiscalização dos trabalhos de agricultura prática realizados pelos campos de demonstração.

Cada campo de demonstração teve uma trajetória singular. O campo de Macaíba, por exemplo, dedicou-se, inicialmente, ao cultivo de cana-de-açúcar, arroz, algodão, milho e videiras (Brasil, 1912, p. 25). Já o de Resende possuía culturas de arroz, milho, amendoim e feijão (Brasil, 1917c, p. 16) e o de Itajaí destacava-se pela seção de viticultura (Brasil, 1917c, p. 19). Os campos de Xiririca e São Cristóvão tiveram suas atividades paralisadas em 1913 por falta de verba (Brasil, 1917c, p. 20). Em 1918, novos campos foram criados no Distrito Federal e em Ilhéus, Bahia, pelos decretos n. 13.104 e 13.170.

O campo de Deodoro foi transformado em uma estação de pomicultura pelo decreto n. 13.010, de 4 de maio de 1918, com as atribuições de produzir plantas frutíferas nacionais e exóticas, aclimatadas para distribuição gratuita aos lavradores e às dependências do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio; introduzir novas plantas frutíferas; estudar as doenças das árvores frutíferas, os meios de transporte de plantas e de embalagem mais adequados às frutas, e os melhores processos de sua conservação. Além disso, a estação deveria manter um aprendizado destinado ao ensino prático dos trabalhos relativos à pomicultura para pessoas de 15 a 18 anos (Brasil, 1919, p. 541-543).

Em 1920, a Estação de Pomicultura de Deodoro e os campos de demonstração do Espírito Santo, Resende e Itajaí foram subordinados diretamente ao ministério pelo decreto n. 14.246, de 1º de julho. Logo em seguida, os três últimos seriam incorporados ao Serviço de Sementeiras e transformados em campos de sementes pelo decreto n. 14.325, de 24 de agosto. O Serviço de Sementeiras foi extinto pelo decreto n. 16.220, de 28 de novembro de 1923, e os campos de sementes, transferidos para o então denominado Serviço de Inspeção e Fomento Agrícolas. Um ano depois, foi a vez da Estação de Pomicultura de Deodoro, que passou a integrar a estrutura do serviço pelo decreto n. 16.663, de 5 de novembro.

 

Angélica Ricci Camargo
Fev. 2020

 

Fontes e bibliografia

BRASIL. Decreto n. 7.556, de 16 de setembro de 1909. Cria o Serviço de Inspeção Agrícola. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 385-387, 1909.

______. Decreto n. 8.319, de 20 de outubro de 1910. Cria o Ensino Agronômico e aprova o respectivo regulamento. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, parte 2, p. 1.046-1.122, 1913.

______. Decreto n. 8.768, de 7 de junho de 1911. Dá regulamento aos campos de demonstração criados pelo decreto n. 8.319, de 20 de outubro de 1910. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 1.096-1.105, 1915.

______. Decreto n. 11.436, de 13 de janeiro de 1915. Dá novo regulamento à Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 20-44, 1917a.

______. Decreto n. 11.998, de 22 de março de 1916. Dá novo regulamento ao Serviço de Agricultura Prática. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 3, p. 342-359, 1917b.

______. Decreto n. 13.010, de 4 de maio de 1918. Transforma em estação de pomicultura o Campo de Demonstração de Deodoro. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 541-543, 1919.

______. Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado da Agricultura, Indústria, Comércio dr. Pedro de Toledo em 1912. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1912. Disponível em: https://bit.ly/2P9Kz8Z. Acesso em: 19 fev. 2020.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado da Agricultura, Indústria e Comércio José Rufino Beserra Cavalcanti no ano de 1917, v. 1. Rio de Janeiro: s.n., 1917c. Disponível em: https://bit.ly/38ItOJI. Acesso em: 19 fev. 2020.

HENRIQUES, Amilson Barbosa. Agriculturar a agricultura: a modernização da agricultura no governo estadual paulista (1892-1926). Tese (Doutorado em História) – Faculdade de Ciência e Letras, Universidade Estadual de São Paulo, Assis, SP, 2015. Disponível em: https://bit.ly/2T50oz1. Acesso em: 17 fev. 2020.

MENDONÇA, Sônia Regina. O ruralismo brasileiro (1888-1931). São Paulo: Hucitec, 1997.

MINISTÉRIO da Agricultura, Indústria e Comércio. In: DICIONÁRIO da Administração Pública Brasileira da Primeira República (1889-1930), 2018. Disponível em: https://bit.ly/2UhlYma. Acesso em: 17 fev. 2020.

OLIVEIRA, Milton Ramon Pires de. Civilizar e modernizar: o ensino agrícola no Brasil republicano (1889-1930). História da Educação (Asphe/FaE/UFPel), Pelotas, n. 15, p. 129-142, 2004.

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

 

Referência da imagem

Arquivo Nacional, Coleção Academia Brasileira de Letras, BR_RJANRIO_O2_0_FOT_183_4

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