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Ministério Público

Publicado: Quarta, 28 de Fevereiro de 2018, 13h03 | Última atualização em Quarta, 27 de Março de 2024, 14h01 | Acessos: 3471

 O Ministério Público foi criado pelo decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, que organizou a Justiça Federal, no contexto das transformações administrativas promovidas pelo governo provisório após a Proclamação da República. Na exposição de motivos que serviu como justificativa para a aprovação do ato, o então ministro da Justiça, Manuel Ferraz de Campos Sales, reconheceu o órgão como uma “instituição necessária em toda a organização democrática”, ao qual cabia velar pela execução das leis, decretos e regulamentos aplicados pela Justiça Federal e promover a ação pública quando necessário, tendo sua independência resguardada (Sales, 1890, s.p.).

Segundo o decreto n. 848, o Ministério Público era composto pelo procurador-geral da República, cargo vitalício que seria ocupado por um dos membros do Supremo Tribunal Federal, escolhido pelo presidente e pelos procuradores em cada seção da Justiça Federal. Ao procurador-geral competia exercer a ação pública e promovê-la até final em todas as causas da competência do Supremo Tribunal Federal; funcionar como representante da União em todos os feitos submetidos à jurisdição do Supremo Tribunal Federal; velar pela execução das leis, decretos e regulamentos aplicados pelos juízes federais; defender a jurisdição do Supremo Tribunal Federal e a dos juízes federais; fornecer instruções e conselhos aos procuradores seccionais e resolver suas consultas sobre matéria concernente ao exercício da Justiça Federal.

Existem diversas divergências em relação às origens do Ministério Público, tendo sido essa expressão utilizada primeiramente na França, no século XVIII, quando foi definido o seu papel na fiscalização do cumprimento das leis (Abreu, 2010, p. 17-18). Em Portugal, os antecedentes do Ministério Público podem ser localizados nos cargos de procurador dos feitos do rei, também denominado de procurador “dos nossos feitos” ou da Coroa e de promotor de justiça.

O procurador dos feitos do rei, regulamentado pelas Ordenações Afonsinas promulgadas em 1446, tinha como finalidade representar o rei perante o juízo nas causas que envolvessem direitos régios nas suas relações individuais contra particulares. Nas Ordenações Filipinas, de 1603, além do procurador dos feitos da Coroa, é mencionado também o procurador dos feitos da Fazenda, encarregado de participar dos despachos das causas fiscais e aduaneiras. O promotor de justiça, citado nas Ordenações Manuelinas de 1521, tinha como competência requerer todas as coisas pertencentes à Justiça, tal como aquelas referentes à conservação da jurisdição real (Fonseca, 2013, p. 149; Silva, 2015, p. 126; Leite, 2006, p. 1035).

No Brasil colonial, a instituição do primeiro tribunal da Relação, na Bahia, em 1609, implicou o estabelecimento do cargo de procurador dos feitos da Coroa, Fazenda e Fisco, que também serviria como promotor de justiça, tal como ocorreu posteriormente com a criação da Relação do Rio de Janeiro.

Após a Independência, a Constituição promulgada em 1824 conferiu o encargo da acusação criminal ao procurador da Coroa e Soberania Nacional, que existiria em cada uma das relações do Império, e que teria suas funções definidas nos regulamentos dessas instituições aprovados ao longo desse período. O cargo de promotor também foi objeto de uma maior sistematização, como visto no Código do Processo Criminal de Primeira Instância, aprovado pela lei de 29 de novembro de 1832, que determinou a existência de um promotor em cada termo ou julgado, tratando-o como “órgão da sociedade, titular da ação penal” (Macedo Júnior, 2010, p. 69), o que culminou em uma “gradual separação entre a tutela dos interesses da coroa e a tutela de interesse público na administração da justiça” (Silva, 2015, p. 129).

No contexto republicano, a primeira menção ao Ministério Público apareceu no Código Penal promulgado pelo decreto n. 847, da mesma data do ato da criação da instituição, que definiu a sua função na promoção da ação penal por denúncia em todos os crimes e contravenções, exceto os furtos e danos sem flagrante, os crimes de violência carnal, rapto, adultério, parto suposto, calúnia e injúria, em que somente caberia proceder por queixa da parte, e mediante procedimento ex-officio nos crimes inafiançáveis, quando não fosse apresentada a denúncia nos prazos da lei (Brasil, 1890a, p. 2736). Exceções foram alteradas posteriormente, com a lei n. 628, de 28 de outubro de 1899, ampliando a ação penal por denúncia do Ministério Público, que passou a abarcar os furtos e os danos a coisas de domínio ou uso público da União, dos estados e municípios, incluindo os documentos públicos.

Além da organização da Justiça Federal e da instituição do Ministério Público, foi estabelecido ainda o Ministério Público do Distrito Federal, cuja administração estava sob a responsabilidade da Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça, e, a partir da lei n. 23, de 30 de outubro de 1891, do Ministério da Justiça e Negócios Interiores. A Constituição promulgada em 1891 apenas se referiu ao cargo de procurador-geral da República, no âmbito da seção dedicada ao Poder Judiciário, cujas atribuições seriam definidas em lei.

O Ministério Público foi regulamentado em diversas ocasiões ao longo da Primeira República. Em 8 de agosto de 1891, o regimento interno do Supremo Tribunal Federal acrescentou competências ao procurador-geral da República, tais como a de exercer as atribuições do procurador da Soberania e Fazenda Nacional e de promotor da Justiça Federal; solicitar a revisão dos processos findos em matéria criminal quando necessário; submeter novo processo ou julgamento nos casos de nulidade absoluta ou de pleno direito; declarar a inocência do condenado diante da apresentação de novas provas; promover o andamento dos processos e a execução das respectivas sentenças; responder às consultas do governo federal em relação aos interesses da Justiça, Fazenda e soberania nacional; dar posse aos procuradores seccionais e nomear seus substitutos; requisitar da autoridade competente as diligências, as certidões, e quaisquer esclarecimentos necessários para regular desempenho de suas funções.

A lei n. 221, de 20 de novembro de 1894, que completou a organização da Justiça Federal da República, ampliou as atribuições do procurador-geral, ao qual cabia também suscitar os conflitos entre um governo estadual e o da União perante o Supremo Tribunal Federal; prover as causas propostas pela União contra o governo ou a Fazenda Pública de qualquer dos estados ou do Distrito Federal e defender os direitos da União nas causas movidas por membros ou nação estrangeira; representar aos poderes públicos na observância da Constituição, de leis e tratados federais; consultar as secretarias de Estado sobre assuntos relativos à extradição, expulsão de estrangeiros, execução de sentença de tribunais estrangeiros, autorização de funcionamento para as companhias estrangeiras, concessão e caducidade de privilégios, patentes de invenção, contratos de serviços públicos, bens nacionais, aposentadorias, reformas, jubilações, pensões, montepio dos funcionários públicos federais; apresentar ao presidente da República o relatório dos trabalhos do Ministério Público.

Com a criação do cargo de consultor-geral da República, pelo decreto n. 967, de 2 de janeiro de 1903, o procurador-geral perdeu as funções de consulta aos ministérios sobre questões relacionadas a estrangeiros, Fazenda e funcionários públicos. Em 1909, o regimento interno do Supremo Tribunal somou às funções do procurador-geral as tarefas de oficiar e dizer de direito nas causas criminais, nas cíveis de interesse da União, da Fazenda Nacional e das pessoas incapazes ou representadas por tutores ou curadores; requerer exame de sanidade dos juízes federais inabilitados para o exercício da judicatura, entre outras. A lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916, que aprovou o Código Civil, detalhou o papel do Ministério Público no que concernia a questões como a curadoria das fundações, a ação de nulidade de vários atos jurídicos e do casamento civil, o zelo dos interesses de menores quando necessário, a proposição de ação de interdição de incapazes, a solicitação da nomeação de curador dos ausentes, entre outros pontos.

A estrutura do Ministério Público também sofreu alterações nessa época. A lei n. 221, de 20 de novembro de 1894, determinou que os procuradores seccionais fossem auxiliados por adjuntos, ajudantes e solicitadores. O decreto n. 1.166, de 17 de dezembro de 1892, que reorganizou o Ministério da Fazenda, determinou que um dos diretores do Tribunal de Contas fosse um representante do Ministério Público. Em 1928, o decreto n. 5.569, de 13 de novembro de 1928, criou um representante do Ministério Público junto à Diretoria-Geral da Propriedade Industrial e à Junta Comercial, com as atribuições de dar parecer sobre os pedidos de patentes e marcas de indústria e comércio e a todos os recursos interpostos das decisões sobre registro de patentes de invenção e marcas de indústria e comércio; funcionar na primeira instância da Justiça Federal, como autor ou assistente, nas ações referentes a nulidade e caducidade das patentes de invenção e marcas de fábrica; funcionar nos processos de suspensão e destituição de agentes de leilões e intérpretes comerciais; entre outras.

Novas transformações ocorreriam durante o governo de Getúlio Vargas, especialmente com a Constituição promulgada em 1934, a primeira que dedicou uma seção específica ao Ministério Público e desvinculou o cargo de procurador-geral a um dos membros do Supremo Tribunal Federal, dentre outras disposições.

 

Angélica Ricci Camargo 
Jun. 2017

 

Fontes e bibliografia

ABREU, Alzira Alves de. O que é Ministério Público? Rio de Janeiro: Editora FGV, 2010.

BRASIL. Decreto n. 847, de 11 de outubro de 1890. Promulga o Código Penal. Decretos do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, fascículo 10, p. 2664-2743, 1890.

______. Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890. Organiza a justiça federal. Decretos do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, fascículo 10, p. 2744-2791, 1890.

______. Decreto n. 1.166, de 17 de dezembro de 1892. Dá regulamento para execução da lei n. 23, de 30 de outubro de 1891, na parte referente ao Ministério da Fazenda. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, parte 2, p. 1028-1074, 1893.

______. Lei n. 221, de 20 de novembro de 1894. Completa a organização da Justiça Federal da República. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 16-41, 1895.

______ Decreto n. 967, de 2 de janeiro de 1903. Cria o lugar de consultor-geral da República. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 4-5, 1907.

______. Decreto n. 5.569, de 13 de novembro de 1928. Cria o cargo de representante do Ministério Público perante a Diretoria-Geral de Propriedade Industrial e a Junta Comercial. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 183-185, 1929.

FONSECA, Domingos Thadeu Ribeiro da. A genealogia do Ministério Público Brasileiro: de remota concepção, gestado no direito português e partejado no Iluminismo francês. Revista Justiça e Sistema Criminal, Curitiba, v. 5, n. 9, p. 131-166, jul./dez. 2013.

LEITE, Rosimeire Ventura. Organização Judiciária nas Ordenações Manuelinas. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 101, p. 1021-1044, jan./dez. 2006.

MACEDO JÚNIOR, Ronaldo Porto. A evolução institucional do ministério público brasileiro. In: SADEK, Maria Tereza (org.). Uma introdução ao estudo da justiça. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, p. 65-94, 2010. Disponível em: https://goo.gl/xw5DiR. Acesso em: 29 jun. 2017.

REGIMENTO interno do Supremo Tribunal Federal, de 8 de agosto de 1891. Revista O Direito, v. 57, p. 169-210, de 8 de agosto de 1891. Disponível em: https://goo.gl/EEgfgK. Acesso em: 29 jun. 2017.

REGIMENTO interno do Supremo Tribunal Federal, de 24 de maio de 1909. Revista O Direito, v. 109, p. 308-371, de 24 de maio de 1909. Disponível em: https://goo.gl/Ci3cWT. Acesso em: 29 jun. 2017.

SALGADO, J. A. César. Campos Salles, o precursor da independência no Ministério Público do Brasil. Revista do Instituto Histórico e Geographico de São Paulo, São Paulo, v. 61, p. 13-24, 1965.

SALES, Manuel Ferraz de. [Exposição de motivos do decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890]. Disponível em: https://goo.gl/238v6z. Acesso em: 26 jun. 2017.

SILVA, Edimar Carmo da. Ministério Público: Evolução Histórico-Normativa no Brasil. R. Minist. Públ. Dist. Fed. Territ., Brasília, n. 9, p. 117-156, 2015. Disponível em: https://goo.gl/zjEoCi. Acesso em: 20 jun. 2017.

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

BR_RJANRIO_Q6 Floriano Peixoto

BR_RJANRIO_AF Série Justiça - Administração (IJ2)

 

Referência da imagem

Estereoscopia Rodrigues & Co., Rio de Janeiro, [1898-1902]. Fotografias Avulsas. BR_RJANRIO_O2_0_FOT_00473_001

 

 

 

 

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