A Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos foi estabelecida no Brasil por decreto expedido pelo príncipe regente d. João, de 11 de março de 1808. Em 1807, fugindo das guerras napoleônicas em Portugal, d. João transferiu a Corte portuguesa para o Brasil, instalando em terras americanas parte do aparato administrativo do Império luso, inclusive as secretarias de Estado. Assim, em 11 de outubro de 1808 foram nomeados os ministros, cabendo a pasta da Marinha no Brasil a d. João Rodrigues de Sá e Melo Meneses, o visconde de Anadia.
Em 1820, com a eclosão em Portugal da Revolução Liberal do Porto, foram convocadas as Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, exigindo o retorno do monarca a Portugal e formando uma junta governativa, que atuaria durante o período em que o rei permanecesse fora. Reunidas em Lisboa, as Cortes expediram, em 8 de novembro de 1821, um decreto determinando a mudança de nome e funções da secretaria. A partir desta data, os negócios de Ultramar passariam a ser expedidos pelas outras secretarias existentes, segundo a sua natureza, fossem relativos ao Reino, à Justiça, à Fazenda, à Guerra ou aos Estrangeiros. Desta forma caberia à Secretaria de Marinha apenas os assuntos que dissessem respeito estritamente à força naval e suas repartições de administração em terra, como os arsenais, armazéns, hospitais e escolas de formação. Após esse ato a secretaria passaria a denominar-se somente Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha.
Desde sua instalação em 1808 até o início do Segundo Reinado, em 1840, a Secretaria da Marinha não sofreu alterações em sua organização central, funcionando com uma estrutura bastante simples e reduzida, que contava apenas com o ministro, um oficial-maior e oficiais e amanuenses em número não determinado pela legislação, para dar conta de seu expediente.
A primeira tentativa de implantar uma estrutura administrativa mais especializada ocorreu em 1840, com o decreto n. 55, que criou uma Contadoria Geral de Marinha anexa à secretaria. Contudo, em dezembro do ano seguinte o novo ministro da pasta, marquês de Paranaguá, determinou, por meio do decreto n. 110, que ficasse sem efeito o ato que criou a Contadoria, usando como justificativa em seus relatórios a falta de recursos para a manutenção desta repartição. Paranaguá, todavia, empreendeu ainda em janeiro de 1842 a primeira reforma da estrutura central da secretaria pelo decreto n. 114, que dividiu o serviço em três seções. A Primeira Seção seria responsável pelos negócios da marinha na Corte e à Segunda Seção competiriam os negócios nas províncias. Inovadora nesta reforma foi a criação de uma seção de contabilidade, sob o denominação de Terceira Seção.
Após essa reforma, os governantes ainda buscavam a melhor forma de organizar a fiscalização dos gastos da secretaria e, em 1844, o órgão sofreu mais uma reestruturação, através do decreto n. 351. As seções da Corte e das Províncias foram extintas e, a partir de então, caberia ao oficial maior a distribuição dos trabalhos da secretaria entre os oficiais e amanuenses da forma que achasse mais adequada. O ato determinava ainda que a recém-criada Seção de Contabilidade continuaria funcionando, mas por um curto espaço de tempo, somente enquanto não fosse criada outra repartição para esse fim.
Em 1845, uma nova reorganização promoveu a extinção da Seção de Contabilidade, da Secretaria da Marinha, e da Contadoria existente na Intendência de Marinha da Corte, o que foi determinado pelo decreto n. 350. No lugar dessas repartições o decreto n. 424, do mesmo ano, criou a Contadoria Geral de Marinha na Corte, que teria como subordinadas outras contadorias de Marinha nas províncias da Bahia, Pernambuco, Pará e Rio Grande do Sul, regulamentadas pelo decreto n. 448, de 19 de maio de 1846. Este novo modelo retirou mais uma vez os trabalhos de contabilidade da estrutura central da Secretaria de Marinha, passando a Contadoria a ser uma repartição à parte.
Após essas primeiras reformas ocorridas nos anos de 1840, envolvendo quase sempre as repartições ligadas à atividade financeira, os anos de 1850 serão marcados pela criação de um novo elemento na administração da Marinha: o Conselho Naval. Sendo solicitada a criação de um órgão com tais características desde os anos de 1830, na administração de Joaquim José Rodrigues Torres, o Conselho Naval só será implantado no Brasil em 1856. Tomando como exemplo nações que possuíam forças navais de referência, como Portugal, França e Inglaterra, sucessivos ministros empenharam-se na batalha pela criação de um órgão permanente, composto por ‘homens capazes e entendidos nos assuntos da força naval’, que assessorasse o ministro na resolução dos problemas enfrentados na Marinha.
Desta forma, a lei n. 874, de 23 de agosto de 1856, instituiu na capital do Império o Conselho Naval, composto por 3 membros permanentes, que deveriam ser oficiais de patente não inferior à de capitão de fragata, e mais dois membros adjuntos, sendo um oficial superior de engenheiros e o outro primeiro construtor naval. Eles deveriam, sempre que solicitados pelo ministro, emitir pareceres em assuntos relativos à força naval, seu empenho, orçamento e recrutamento, bem como o estabelecimento e organização das repartições subordinadas, como os arsenais, faróis, e escolas, além das construções navais e reservas de madeiras. Deveriam ainda, a cada dois anos ou sempre que o governo achasse necessário, visitar os arsenais, intendências e estabelecimentos da Marinha para fiscalizar de perto o cumprimento das instruções, ordens permanentes, pontualidade, além de observar o bom funcionamento destes órgãos.
O art. 12 da lei n. 874 ordenava ainda a adaptação administrativa do Quartel-General da Marinha e da Secretaria de Estado, para que se adequassem à criação da nova repartição, que redimensionaria as instituições de comando da Marinha. Tais medidas foram cumpridas em 1859, quando a lei n. 2.359 reformou a Secretaria de Estado. A partir deste decreto, a secretaria passou a estruturar-se por seções, porém, dessa vez, em uma divisão mais complexa do que a anterior, de 1842, que previa apenas uma seção para os assuntos da Corte e outra para os de províncias. De acordo com o novo arranjo, haveria quatro seções, sendo a Seção Central responsável pelo preparo de leis, assuntos burocráticos de pessoal, expediente, arquivo e fiscalização das despesas do ministério. À Primeira Seção caberia a supervisão dos estabelecimentos como biblioteca, hospitais e asilo de inválidos, além das tropas e navios. A Segunda Seção seria responsável pelo trabalho dos Conselhos, incluído o Conselho Naval, escolas de formação, além das contadorias, intendências e serviços de portos, como as capitanias de portos, melhoramentos em geral, construção de diques e o serviço de faróis. A Terceira Seção seria a responsável pelos arsenais e pelos demais assuntos que não fossem de competência das outras seções. Essa reforma instituiu ainda pela primeira vez o gabinete do ministro na estrutura da secretaria.
Em 1868 a Marinha será mais uma vez reformada, em cumprimento ao 3º parágrafo do artigo 36 da lei de orçamento de 1867, que determinou reformas em todas as secretarias de Estado visando à diminuição de pessoal e redução das despesas. Com isso, o serviço da secretaria continuou sendo dividido entre quatro seções, mas com competências diferentes em relação à organização de 1859. À Primeira Seção, ou Seção Central, caberia o serviço de protocolo e burocrático dos empregados, impressão de atos legislativos, cadastro do pessoal civil, o expediente e arquivo da secretaria, o expediente da Marinha nas seções do Conselho de Estado, a contabilidade das despesas da secretaria, além dos temas que não fossem de competência das demais seções. À Segunda Seção competiriam os assuntos do Conselho Supremo Militar, do Quartel General da Marinha, do Conselho Naval, os funcionários militares e as tropas, o Asilo dos Inválidos, os hospitais, as explorações e trabalhos hidrográficos, as escolas práticas e de aplicação e o recrutamento. A Terceira Seção seria responsável pela engenharia naval e civil, pelos serviços de porto e costas e pela Escola de Marinha. A Quarta Seção seria encarregada das finanças e abastecimento da Marinha, cabendo-lhe, ainda, a organização da Contadoria, Intendência, almoxarifados, conselhos de compras e demais repartições fiscais ou de arrecadação da Marinha.
Até o final do período imperial a Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha foi reformada somente uma vez mais, em 22 de dezembro de 1877, pelo o decreto n. 6.782, que converteu a Secretaria do Conselho Naval na Quinta Seção. Tal reforma aproximou o Conselho Naval da estrutura central de comando da secretaria, passando o seu secretário a possuir o cargo de diretor de seção. Entretanto, não houve qualquer reforma nos regulamentos do Conselho Naval, continuando o seu arquivo a possuir funcionamento próprio, independente do Arquivo Geral da secretaria.
Felipe Pessanha de Almeida
9 jun. 2014
Bibliografia
CAMINHA, Herick Marques. Organização e administração do Ministério da Marinha no império. Brasília: FUNCEP, 1986.
ALMEIDA, Felipe Pessanha de. A Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha (1822-1889). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2014. (Publicações Históricas; 92) (Cadernos Mapa; 8 – Memória da Administração Pública Brasileira). Disponível em: <https://goo.gl/KNK4Hx> Acesso em: 25 abr. 2014.
Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR AN,RIO ON Afonso Pena
BR AN,RIO 1R Conselho de Estado
BR AN,RIO 1X Conselho Supremo Militar e de Justiça
BR AN,RIO 22 Decretos do Executivo – Período Imperial
BR AN,RIO 23 Decretos do Executivo – Período Republicano
BR AN,RIO 2H Diversos – SDH – Caixas
BR AN,RIO NP Diversos – SDH – Códices
BR AN,RIO OI Diversos GIFI – Caixas e Códices
BR AN,RIO 4X Ministério da Marinha
BR AN,RIO 59 Negócios de Portugal
BR AN,RIO 0E Polícia da Corte
BR AN,RIO 8D Secretaria do Governo da Nova Colônia de Sacramento
BR AN,RIO 8E Secretaria do Governo da Província de São Paulo
BR AN,RIO 8T Série Agricultura – Terras Públicas e Colonização (IA6)
BR AN,RIO DA Série Guerra – Gabinete do Ministro (IG1)
BR AN,RIO A6 Série Interior – Gabinete do Ministro (IJJ1)
BR AN,RIO AI Série Justiça – Gabinete do Ministro (IJ1)
BR AN,RIO AM Série Justiça – Polícia – Escravos – Moeda Falsa – Africanos (IJ6)
BR AN,RIO AS Série Marinha – Batalhão Naval – Inválidos (XV M)
BR AN,RIO AT Série Marinha – Capitania dos Portos (XVI M)
BR AN,RIO AV Série Marinha – Contadoria (IM)
BR AN,RIO AX Série Marinha – Inspeção do Arsenal da Corte (V M)
BR AN,RIO AY Série Marinha – Inspeção do Arsenal de Pernambuco (XII M)
BR AN,RIO B0 Série Marinha – Intendência da Corte (VII M)
BR AN,RIO B1 Série Marinha – Intendência e Inspeção da Bahia (XI M)
BR AN,RIO B2 Série Marinha – Ministro – Secretaria de Estado (X M)
BR AN,RIO B3 Série Marinha – Navios – Força Naval – Distritos Navais (IV M)
BR AN,RIO B5 Série Marinha – Quartel-General e Conselho Naval (III M)
BR AN,RIO B6 Série Marinha – Socorros de Marinha – Corpo de Fazenda (XVII M)
BR AN,RIO KE – Publicações Oficiais – Acervo Geral e Periódicos
Referência da imagem
GRV 142
Este verbete refere-se apenas à trajetória do órgão no período imperial. Para informações entre 1808-1822 e 1889-1930, consulte os verbetes Secretaria de Estado dos Negócios da Marinha e Domínios Ultramarinos e Ministério da Marinha