Cascata da Floresta da Tijuca, litografia de J. M. Rugendas
Cascata da Floresta da Tijuca, litografia de J. M. Rugendas

O Serviço Florestal do Brasil foi criado pelo decreto legislativo n. 4.421, de 28 de dezembro de 1921, com o objetivo de promover a conservação, beneficiamento, reconstituição, formação e aproveitamento das florestas, o que compreendia o auxílio à preservação, criação e guarda das florestas protetoras; o estabelecimento e propagação dos conhecimentos relativos à silvicultura, incluindo-se a distribuição de sementes e mudas; o estudo e difusão dos processos de conservação das madeiras; a organização da estatística florestal; a escolha das regiões para instituição das reservas florestais; o estudo das condições para a criação de parques nacionais; a determinação de medidas de proteção e de polícia florestal; e a divulgação, por meio de publicações, de trabalhos dedicados às florestas (Brasil, 1922, p. 352-354).

A preocupação com a conservação de espécies vegetais específicas esteve presente na legislação portuguesa, ainda no início do período colonial, com a finalidade de proteger os produtos de grande valor econômico que se tornavam cada vez mais escassos, como o pau-brasil. Além disso, outros aspectos ligados ao impacto da devastação das florestas começaram a receber destaque, especialmente no século XVIII, quando ocorreu a sistematização do conceito de silvicultura na França e na Alemanha, entendida como o planejamento ou uso científico das florestas voltado para a produção de bens econômicos. Também datam dessa época a criação de escolas dedicadas aos estudos florestais e a ampliação de iniciativas de reflorestamento em diversos países (Leão, 2000, p. 142-146).

No Brasil, um empreendimento importante ocorreu no período imperial, com o reflorestamento da Floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, realizado com o fim de restaurar e regular os cursos de água e solucionar os problemas de abastecimento enfrentados pela cidade (Dean, 1995, p. 104). Tal determinação foi aprovada em 1861, pela decisão n. 577, de 11 de dezembro, que deu instruções para o plantio e a conservação das florestas da Tijuca e das Paineiras, que ficaram a cargo de administrações subordinadas à Inspeção das Obras Públicas.

Apesar do êxito da iniciativa, não houve uma atenção mais ampla ao problema, que crescia, sobretudo, em razão da expansão da economia cafeeira. À ação direta de queimadas de florestas para plantação de cafezais, somavam-se outros fatores, como a urbanização, a industrialização e a construção de ferrovias, que contribuíram para o desflorestamento de vastas áreas cobertas pela Mata Atlântica, principalmente nos estados das atuais regiões Sudeste e Sul do país (Dean, 2010, p. 206).

Essa situação se manteve após a Proclamação de República em 1889. Apenas nas primeiras décadas do século XX, as preocupações conservacionistas apareceram com destaque nos debates públicos e entre as políticas governamentais. As dificuldades de importação de carvão para utilização nas ferrovias demandaram o aumento da queima de madeiras, despertando maior interesse para o assunto, que se juntou à divulgação de pesquisas sobre as consequências da destruição de florestas e de experiências de reflorestamento realizadas em outros países. Ainda nesse momento, vários intelectuais, como Alberto Torres, chamaram a atenção para o tema da proteção à natureza associado ao fortalecimento do Estado e à construção de uma identidade nacional, que ganharia maior importância na década de 1930 (Franco; Drummond, 2009, p. 11).

Em 1920, o presidente da República, Epitácio Pessoa, em sua mensagem ao Congresso Nacional, enfatizou a necessidade de se “preservar e restaurar o revestimento florestal” e reclamou “medidas severas de repressão” aos responsáveis pelas devastações (Brasil, 1920, p. 146).

No ano seguinte, a aprovação do decreto n. 4.421, que criou o Serviço Florestal do Brasil, representou uma primeira tentativa de enfrentar essa questão. O ato evidenciou os efeitos da preservação de florestas para a defesa da salubridade e o aumento da riqueza pública, elencando sua importância para o benefício da higiene e saúde públicas; a garantia da pureza dos mananciais de água; o equilíbrio do regime das águas correntes destinadas às irrigações das terras agrícolas, às vias de transporte e ao aproveitamento de energia; a diminuição dos efeitos negativos dos agentes atmosféricos, como erosões etc.; e como meio auxiliar da proteção das fronteiras (Brasil, 1922, p. 352-353).

O decreto determinou o estabelecimento de uma organização complexa, formada por hortos florestais, florestas-modelos, reservas florestais, parques nacionais e delegacias estaduais. Isto incluía uma estrutura de ensino composta por escolas teórico-práticas de silvicultura, escolas práticas e ensino ambulante. Tal configuração assemelhava-se à do ensino agronômico, instituído em 1909, e voltava-se para a formação e o aprimoramento profissional destinado à exploração sistemática das florestas.

Também foi previstaa criação de uma polícia para controle das reservas florestais e do Serviço de Defesa Florestal, incumbido do levantamento da carta florestal do Brasil, de realizar estudos de aclimação de espécies exóticas, de germinação e ensaio de sementes e da manutenção de um curso prático de agricultura para o preparo de guardas florestais, dentre outras atribuições.

Em 1925, o decreto n. 17.042, de 16 de setembro, regulamentou o órgão, preservando, com poucas alterações, as competências definidas pelo ato de 1921. De acordo com o regulamento, o Serviço Florestal do Brasil seria formado pelo diretor-geral, que acumularia o cargo de diretor do Horto Florestal do Rio de Janeiro, um assistente, um botânico, um inspetor-geral, um secretário, um escriturário, dois datilógrafos, um conservador do museu, um porteiro e contínuo e dois serventes, podendo admitir guardas florestais, capatazes, feitores e trabalhadores, de acordo com as necessidades e recursos orçamentários. Outra novidade nesse ato foi o estabelecimento de punições para os responsáveis por danos às árvores, hortos e parques, que podia variar entre multas e prisão de 45 a 60 dias, conforme a gravidade da infração. O decreto ainda determinou a articulação do serviço com outros órgãos do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, para a realização de pesquisas e trabalhos mais específicos, como o Museu Nacional, ao qual seriam confiados os assuntos relacionados à zoologia florestal; o Instituto Biológico de Defesa Agrícola, encarregado dos aspectos referentes à profilaxia e tratamento das doenças e pragas das essências florestais; e o Serviço de Inspeção e Fomento Agrícolas, responsável pela coleta de dados e informações concernentes às diversas zonas florestais do país em conjunto com a Diretoria de Meteorologia (Brasil, 1926).

Em um primeiro momento, o Serviço Florestal funcionou anexo ao Horto Florestal do Jardim Botânico. Segundo relatório do ministro da Agricultura, Indústria e Comércio, o órgão iniciou suas atividades em 1926. Nesse ano, foi criado o Horto Florestal de Resende, no estado do Rio de Janeiro, realizados estudos de espécies que poderiam ser aproveitadas pela medicina, como a sapucaia, da qual era extraído o óleo utilizado para a cura da ‘morfeia’, e distribuídas mudas e sementes (Brasil, 1928, p. 121-126).

A falta de recursos orçamentários e de um código florestal contribuiu para o alcance reduzido das atividades do Serviço Florestal nesse período (Dean, 2010, p. 272). No contexto de reformulação do Ministério da Agricultura no governo de Getúlio Vargas, o Serviço Florestal foi integrado à Diretoria-Geral de Agricultura pelo decreto n. 22.338, de 11 de janeiro de 1933, e extinto logo depois pelo decreto n. 22.380, de 20 de janeiro de 1933. Grande parte de suas funções foram assumidas pela 3ª Seção Técnica – Essências Florestais, da Diretoria do Fomento e Defesa Agrícolas, organizada pelo decreto n. 22.416, de 30 de janeiro do mesmo ano. Em 1934, o decreto n. 23.793, de 23 de janeiro, aprovou o primeiro Código Florestal do país, que regulou a exploração de florestas, estabeleceu a estrutura de fiscalização e polícia, definiu as infrações florestais e criou um fundo e um Conselho Florestal.

Angélica Ricci Camargo
Jun. 2019

 

Fontes e bibliografia

BRASIL. Decreto legislativo n. 4.421, de 28 de dezembro de 1921. Cria o Serviço Florestal do Brasil. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 352-360, 1922.

______. Decreto n. 17.042, de 16 de setembro de 1925. Dá regulamento ao Serviço Florestal do Brasil. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 373-384, 1926.

______. Mensagem apresentada ao Congresso Nacional na abertura da terceira sessão da décima legislatura pelo presidente da República Epitácio Pessoa. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1920. Disponível em: https://bit.ly/2Rq5wfz. Acesso em: 19 jun. 2019.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado da Agricultura, Indústria e Comércio Geminiano Lyra Castro em 1926. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1928. Disponível em: https://bit.ly/2FkfIBM. Acesso em: 19 jun. 2019.

DEAN, Warren. A ferro e fogo: a história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. Tradução de Cid Knipel Moreira. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

______. A conservação das florestas no Sudeste do Brasil, 1900-1955. Revista de História, São Paulo, v. 133, p. 103-115, 1995.

FRANCO, José Luiz de Andrade; DRUMMOND, José Augusto. Proteção à natureza e identidade nacional no Brasil: anos 1920-1940. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.

LEÃO, Regina Machado. A floresta e o homem. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo: Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais, 2000.

VIANA, Maurício Borato. A contribuição parlamentar para a política florestal no Brasil. Brasília: Câmara dos Deputados, 2004. Disponível em: https://bit.ly/2Ip1aT7. Acesso em: 19 jun. 2019.

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados no seguinte fundo do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

 

Referência da imagem

Johann Moritz Rugendas. Voyage pittoresque dans Le Brésil. Paris: Engelmann & Cie., 1835. Arquivo Nacional. OR_2119_DIV1_PL12