O Ministério da Aeronáutica foi criado pelo decreto-lei n. 2.961, de 20 de janeiro de 1941, voltado ao desenvolvimento da aviação no campo civil e militar, e à necessidade de uma estrutura governamental mais especializada para lidar com as demandas dessa área, incluindo a defesa aérea, a produção de aeronaves, a infraestrutura aeroportuária e o treinamento profissional. Até então, as atividades relativas à aviação militar estavam sob jurisdição do Ministério da Guerra e Marinha, e a civil, da pasta da Viação e Obras Públicas.
A institucionalização da aviação nos países europeus, como Inglaterra, França e Itália, ocorreu no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), quando o avião se tornou um importante instrumento para observações e batalhas. Na Europa, as nações começaram a implementar ações para tornar autônoma a força aérea militar, como a fundação do Ministério do Ar na Inglaterra (1918), na França (1928) e na Itália (1929). No Brasil, foram instaladas a Escola de Aviação Naval, em 1916, e pouco depois a Escola de Aviação Militar, em 1919. Apesar dessas iniciativas, a aviação brasileira nesse momento funcionou como uma arma auxiliar e incipiente, sem autonomia administrativa, técnica ou operacional (Fraga, 2017, p. 15-17).
A partir dos anos 1920, houve um salto no desenvolvimento da navegação aérea no país. No que se refere à aviação comercial, ao final da década, já operavam no Brasil a francesa Compagnie Generale Aéropostale, que realizava um voo semanal da Europa para a América do Sul, sobrevoando o território brasileiro desde Natal até a fronteira com o Uruguai; a Sindicato Condor Limitada, liberada pelo governo a operar voos em todo o território nacional, Uruguai e Argentina; e a Varig, Viação Aérea Rio Grandense, autorizada a voar no litoral de Santa Catarina, no território do Rio Grande do Sul, podendo chegar até Montevidéu. Em 1930, foi realizado o primeiro voo do dirigível Graff Zeppelin ao Brasil, e, pouco depois, a Sindicato Condor passou a organizar o serviço postal e de passageiros do dirigível alemão no país. A Vasp, Viação Aérea de São Paulo, foi fundada, em 1934, para realizar viagens regulamentares no interior de São Paulo. Acompanhando a expansão da aviação civil, houve o investimento estatal na criação de campos de pouso e aeroportos, bem como de fábricas para atender o transporte aéreo (Modesto, 2019, p. 34-36).
A aviação militar, por sua vez, expandiu-se por meio das escolas de aviação da Marinha e do Exército. Estas, porém, seguiram trajetórias distintas de desenvolvimento, como, por exemplo, os locais onde as atividades eram exercidas, os modelos de aviões adotados, a metodologia de ensino, bem como as parcerias e acordos internacionais. Em comum, amargavam parcos investimentos em estrutura, ocasionando falta de material, pessoal, má conservação de equipamentos e alto índice de acidentes fatais. Em 1934, morreram 38 cadetes aspirantes na Escola de Aviação Militar, em uma turma de 119 alunos, fato que demonstra a precariedade da aviação militar brasileira no período. Outros fatores atribuídos aos acidentes foram problemas de saúde física e psicológica, bem como a falta de respeito às normas de segurança por parte dos pilotos. A indisciplina e insubordinação dos aviadores era recorrente, inclusive alguns aderiam a movimentos oposicionistas ao governo Vargas, em especial a Revolução Constitucionalista, de 1932, e a Intentona Comunista, em 1935. Somados a esses males, existiam ainda frequentes irregularidades administrativas, relacionadas principalmente a roubo de insumos (Fraga, 2017, p. 311-342).
O eclodir da Segunda Guerra Mundial, em 1939, elucidou a importância de uma aviação militar bem estruturada para a garantia da segurança nacional. Além disso, os problemas enfrentados pela aviação, tanto no Exército quanto na Marinha, foram objeto de relatórios que indicavam como solução a criação de um ministério voltado para a sua organização. Ainda que o presidente Getúlio Vargas tenha enfrentado certa oposição por parte da Marinha, ciosa por perder o controle de sua arma aérea, o Exército, os aviadores e a imprensa impulsionaram a campanha a favor (Modesto, 2019). Em 1941, finalmente, a pasta da Aeronáutica foi criada, sendo nomeado como ministro o civil Joaquim Pedro Salgado Filho, como forma de evitar conflitos de interesse entre as aviações do Exército e da Marinha, facilitar o entrosamento entre as armas e o controle político da nova instituição (Forjaz, 2004). Salgado Filho permaneceu à frente do ministério até o final do primeiro governo Vargas.
De acordo com o decreto-lei n. 2.961, o novo ministério seria constituído inicialmente pelo pessoal das aeronáuticas do Exército, da Marinha e do Departamento de Aeronáutica Civil, bem como dos estabelecimentos, instituições e repartições públicas que se propusessem à realização de estudos, serviços ou trabalhos relativos à competência da pasta. Esse mesmo ato transferiu ainda todos os órgãos referentes às atividades de aviação subordinados aos ministérios da Guerra, Marinha e da Viação e Obras Públicas, para o Ministério da Aeronáutica, inclusive todo o patrimônio e orçamento.
O decreto-lei também instituiu as Forças Aéreas Nacionais, embrião da Força Aérea Brasileira (FAB), corporação única subordinada ao Ministério da Aeronáutica, com a missão de proteger e defender o espaço aéreo, sendo composta pelo pessoal militar da arma de aeronáutica do Exército e do Corpo da Aviação Naval. Previu ainda o funcionamento de uma delegacia seccional do Tribunal de Contas e uma subcontadoria, da Contadoria Central da República, no ministério.
No que concerne à aviação civil, ficou a cargo do ministério a coordenação, fiscalização e orientação dos aeroclubes, e dependentes de sua autorização o funcionamento e a instalação de quaisquer entidades, empresas ou companhias destinadas ao estudo e aprendizagem da aeronáutica ou à exploração comercial do transporte aéreo, bem como o fomento à iniciativa particular para o incremento da aviação nacional.
O decreto-lei n. 3.730, de 18 de outubro de 1941, organizou a pasta, estruturando-a nos seguintes órgãos: gabinete do ministro; Estado-Maior da Aeronáutica; comandos de zona aérea; diretorias; e serviços de fazenda da aeronáutica. O ato previu que as diretorias seriam as de Ensino; Técnica Aeronáutica; Obras; Material; Rotas Aéreas; Defesa Antiaérea; Aeronáutica Civil; e do Pessoal. O decreto-lei determinou ainda que a organização das diretorias e demais órgãos deveria ser fixada em regulamento próprio, aprovados por decreto do presidente da República, o que ocorreu ao longo dos anos de 1941 e 1942.
Algumas diretorias previstas no decreto-lei n. 3.730, no entanto, constituíram-se como subdiretorias ligadas a outros órgãos, como foi o caso da Diretoria do Ensino, estabelecida como uma subdiretoria da Diretoria do Pessoal pelo decreto n. 8.288, de 2 de dezembro de 1941; da Diretoria de Técnica Aeronáutica, como uma subdiretoria da Diretoria do Material, pelo decreto n. 8.465, de 26 de dezembro de 1941; da Diretoria de Obras, como uma subdiretoria da Diretoria de Rotas Aéreas, pelo decreto n. 8.531, de 12 de janeiro de 1942; e da Diretoria de Defesa Antiaérea, como uma subdiretoria da Diretoria de Aeronáutica Civil, pelo decreto n. 8.535, de 15 de janeiro de 1942.
Entre 1941 e 1942, foram criadas ainda as escolas da Aeronáutica, pelo decreto-lei n. 3.142, e de Especialistas, pelo decreto-lei n. 3.141, ambas em 25 de março de 1941; o Serviço de Fazenda, pelo decreto-lei n. 3.625, de 17 de setembro de 1941; o Serviço de Saúde da Aeronáutica, pelo decreto-lei n. 4.848, de 20 de outubro de 1942; bem como o Depósito de Aeronáutica do Rio de Janeiro, por meio do decreto-lei n. 4.881, de 29 de outubro de 1942.
Em 1945, a estrutura da pasta foi ampliada mais uma vez, por meio do decreto-lei n. 7.892, de 23 de agosto, que organizou o Serviço de Intendência da Aeronáutica, reunindo órgãos dos serviços financeiros e dos provimentos de material de intendência e de subsistência. Além disso, o decreto-lei n. 8.014, de 29 de setembro, criou o Arquivo Geral da Aeronáutica, voltado para o tratamento e arquivamento da documentação remetida pelos demais órgãos da pasta.
“Pilotos para o Brasil, aviões para os pilotos e técnicos para os aviões. Esta é a flâmula aeronáutica”, frase cunhada por Salgado Filho em 1941, resume a política desenvolvida pelo ministério durante sua gestão. Buscou-se então investir na ampliação do número de pilotos, de aeronaves para treinamento e de engenheiros e mecânicos aptos a projetar e realizar a manutenção dos equipamentos aéreos. Ao mesmo tempo, procurou-se criar uma ‘mentalidade aeronáutica’ para que a população se interessasse e colaborasse para o desenvolvimento da navegação aérea. Além de campanhas nos meios de comunicação, houve o incentivo para que crianças e jovens buscassem a carreira de aviação, como piloto, engenheiro ou técnico, tanto civil quanto militar. Nesse sentido, o governo procurou ampliar os cursos de pilotos, os aeroclubes e a prática de aeromodelismo. Também foi realizada a Campanha Nacional de Aviação (CNA), com o objetivo de pedir à população, sobretudo aos empresários, a doação de dinheiro que seria revertida na compra de aviões para os aeroclubes do país (Fraga, 2021).
Louise Gabler
Abr. 2024
Fontes e bibliografia
BRASIL. Decreto-lei n. 2.961, de 20 de janeiro de 1941. Cria o Ministério da Aeronáutica. Coleção de leis da República Federativa do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 29, 1941.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.021, de 1 de fevereiro de 1941. Dá nova denominação à Diretoria do Exército. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 4 fev. 1941. Seção 1, p. 2.129.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.142, de 25 de março de 1941. Cria no Ministério da Aeronáutica a Escola de Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 27 mar. 1941. Seção 1, p. 6.259.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.141, de 25 de março de 1941. Cria no Ministério da Aeronáutica a Escola de Especialistas de Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 27 mar. 1941. Seção 1, p. 6.259.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.142, de 25 de março de 1941. Cria no Ministério da Aeronáutica a Escola de Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 27 mar. 1941. Seção 1, p. 6.259.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.625, de 17 de setembro de 1941. Cria o Serviço de Fazenda do Ministério da Aeronáutica e aprova o respectivo regulamento. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 20 set. 1941. p. 18.156.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.730, de 18 de outubro de 1941. Organiza o Ministério da Aeronáutica. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 7, p. 185-188, 1942.
BRASIL. Decreto n. 8.170, de 6 de novembro de 1941. Aprova o regulamento do Estado-Maior da Aeronáutica (EMAer). Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 8 nov. 1941. Seção 1, p. 21.276.
BRASIL. Decreto-lei n. 3.838, de 19 de novembro de 1941. Extingue as comissões de eficiência dos Ministérios da Aeronáutica, da Guerra e da Marinha. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 21 nov. 1941. Seção 1, p. 21.933.
BRASIL. Decreto n. 8.261, de 20 de novembro de 1941. Aprova o regulamento provisório para promoção de oficiais da Força Aérea Brasileira. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 22 nov. 1941. Seção 1, p. 22.011.
BRASIL. Decreto n. 8.288, de 2 de dezembro de 1941. Aprova o regulamento da Diretoria de Pessoal do Ministério da Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 4 dez. 1941. Seção 1, p. 22.600.
BRASIL. Decreto n. 8.465, de 26 de dezembro de 1941. Aprova o regulamento da Diretoria do Material do Ministério da Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 29 dez. 1941. Seção 1, p. 23.874.
BRASIL. Decreto n. 8.531, de 12 de janeiro de 1942. Aprova o regulamento da Diretoria de Rotas Aéreas do Ministério da Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 15 jan. 1942. Seção 1, p. 727.
BRASIL. Decreto n. 8.535, de 15 de janeiro de 1942. Aprova o regulamento para a Diretoria de Aeronáutica Civil do Ministério da Aeronáutica. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 27-30, 1942.
BRASIL. Decreto-lei n. 4.812, de 8 de outubro de 1942. Dispõe sobre a requisição de bens imóveis e móveis, necessários às Forças Armadas e à defesa passiva da população e dá outras providências. Lex-Coletânea de legislação e jurisprudência: legislação federal e marginália, São Paulo, p. 490-498, 1942.
BRASIL. Decreto-lei n. 4.848, de 20 de outubro de 1942. Cria o Serviço de Saúde da Aeronáutica e aprova o respectivo regulamento. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 23 out. 1942. Seção 1, p. 15.777.
BRASIL. Decreto-lei n. 4.881, de 29 de outubro de 1942. Cria no Ministério da Aeronáutica o Depósito de Aeronáutica do Rio de Janeiro. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 31 out. 1942. Seção 1, p. 16.113.
BRASIL. Decreto-lei n. 5.005, de 27 de novembro de 1942. Extingue no Ministério da Aeronáutica a Subdiretoria do Ensino, transferindo suas atribuições para o Estado-Maior da Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 30 nov. 1942. Seção 1, p. 17.403.
BRASIL. Decreto n. 11.705, de 24 de fevereiro de 1943. Aprova o regimento da Comissão Central de Requisições. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 25 fev. 1943. Seção 1, p. 2.875.
BRASIL. Decreto-lei n. 7.892, de 23 de agosto de 1945. Organiza o Serviço de Intendência da Aeronáutica. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 24 ago. 1945. Seção 1, p. 13.907.
BRASIL. Decreto-lei n. 8.014, de 29 de setembro de 1945. Cria o ‘Arquivo Geral da Aeronáutica’ e dá outras providências. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 2 out. 1945. Seção 1, p. 15.610.
FORJAZ, Maria Cecília S. As origens da Embraer. Tempo Social, v. 17, n. 1, p. 281-298, 2005. Disponível em: https://tinyurl.com/bdpw26jc. Acesso em: 26 abr. 2024.
FRAGA, André. O Brasil tem asas: a construção de uma mentalidade aeronáutica no governo Vargas. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, Instituto de História, Niterói, 2017. Disponível em: https://tinyurl.com/5e3amr3r. Acesso em: 14 abr. 2024.
FRAGA, André. O desenvolvimento da aviação brasileira no governo Vargas. In: QUE REPÚBLICA é essa?, 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/mc8a7dem. Acesso em: 29 abr. 2024.
MODESTO, Antônio. As Forças Armadas no Estado Novo: tensões político-militares na criação do Ministério da Aeronáutica (1937-1942). Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Salgado de Oliveira, Niterói, 2019. Disponível em: https://tinyurl.com/2h2n2rfr. Acesso em: 14 abr. 2024.
Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_08 Alter de Oliveira Magalhães
BR_DFANBSB_VAZ Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica
BR_DFANBSB_H8 Delegacia de Polícia Federal em Dourados (Mato Grosso do Sul)
BR_RJANRIO_R0 Salgado Filho
BR_RJANRIO_AAI Segunda Seção do Comando Costeiro da Aeronáutica -
Referência da imagem
BR_RJANRIO_R0_0_MAP_0001_d0001de0001 Fundo Salgado Filho.