Esboço explicativo referente à pontaria, ao transporte e às hastes de tração de um canhão, em prancha da Enciclopédia iluminista de Diderot e d’Alembert, publicada em Paris de 1751 a 1772
Esboço explicativo referente à pontaria, ao transporte e às hastes de tração de um canhão, em prancha da Enciclopédia iluminista de Diderot e d’Alembert, publicada em Paris de 1751 a 1772

A chamada Fábrica, ou Casa, de Armas da Fortaleza da Conceição do Rio de Janeiro foi fundada em 1765, diante da necessidade de produção de armamento na colônia.

A instalação de uma fábrica de armas no Brasil inseriu-se no processo de reorganização militar que ocorreu em Portugal durante o século XVIII, parte de um programa maior de centralização e modernização do aparelho do Estado. Em 1736, foi criada a Secretaria de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra e, a partir de 1762, iniciada a reestruturação do Exército português, conduzida pelo conde de Lippe, que resultou no estabelecimento de auditorias de guerra, reforma das tropas, substituição dos terços pelos regimentos e adoção de princípios estratégicos oriundos do modelo prussiano de Frederico II, que valorizava a tática ofensiva. Essas medidas visavam aumentar a coesão e eficiência das forças militares e foram acompanhadas pelo incremento da instrução de oficiais e por inovações no reparo e fabrico de armas (Wehling; Wehling, 2008, p. 27; Nunes, 2004, p. 76-81).

A fabricação e o conserto de armas em Portugal eram deficitários tanto em termos de capacidade de produção quanto em termos tecnológicos. No geral, o armamento ligeiro e o material de artilharia eram produzidos em pequenas quantidades pelo Arsenal Real do Exército, e as espingardas dos modelos de infantaria, carabinas e pistolas, em fundições reais. Este assunto, no entanto, era estratégico para Portugal, especialmente depois da Campanha do Roussillon, ocorrida em 1793, em ação conjunta com a Espanha contra a França, e do ataque de Espanha e França a Portugal em 1801, conhecido como Guerra das Laranjas. Esses dois eventos levaram o país a importar armamentos da Inglaterra e, posteriormente, da Alemanha, de onde também viriam mestres espingardeiros para auxiliar na instalação de uma fábrica de armas nas cidades do Porto e Lisboa (Coelho, 2011, p. 4-6). Com a primeira invasão das tropas napoleônicas a Portugal, a ideia de se construir uma nova fábrica de armas foi abandonada e alguns dos mestres alemães acabaram por acompanhar a transmigração da corte para o Brasil, em 1808 (Coelho, 2011, p. 14).

A vinda da família real trouxe mudanças administrativas importantes, com a instalação de órgãos centrais da administração portuguesa e o aperfeiçoamento daqueles que já existiam na colônia. No caso específico da organização militar, foram instaladas fábricas de ferro e pólvora, reestruturado o Arsenal Real do Exército e criada a Real Academia Militar, entre outras disposições. O alvará de 1º de março de 1811 estabeleceu a Real Junta de Fazenda dos Arsenais do Exército, Fábricas e Fundições, destinada a promover a ordem econômica dos estabelecimentos de guerra e estimular a educação de oficiais e artistas hábeis, o que incluía a Fábrica de Armas da Fortaleza da Conceição.

Nesse cenário, a fábrica que, em 1794, era composta por um inspetor, um escrivão, um mestre espingardeiro, um contramestre, um mestre latoeiro, um mestre coronheiro e um fiel, teve sua estrutura aumentada, entre 1808 e 1822, a partir da ampliação das oficinas, que ocorreu em conjunto com a admissão de aprendizes e do crescimento do quadro de funcionários (Cruz, 1862, p. 454; Almanaques, 1937, p. 303).

Além das atividades da Fábrica da Conceição, foram empreendidas outras medidas destinadas ao incremento da fabricação de armas, como o decreto de 12 de novembro de 1811, que ordenou o estabelecimento de uma oficina de espingardeiros em cada regimento de infantaria e artilharia. Isto, no entanto, parece não ter surtido os efeitos desejados, visto que, em 11 de julho de 1822, as oficinas foram suprimidas, voltando os consertos a serem feitos na Fortaleza da Conceição.

Após a Independência, a Fábrica da Conceição continuou em funcionamento, sendo a mudança mais significativa realizada pelo decreto n. 5.118, de 1872, que a incorporou ao Arsenal de Guerra da Corte, sob a denominação de 3ª Seção. Em 1892, o aviso de 25 de janeiro determinou que a 3ª Seção voltasse a ser chamada de Fábrica de Armas, mas a decisão foi logo revogada pelo aviso de 10 de março do ano seguinte.


Angélica Ricci Camargo
Mar. 2013


Fontes e bibliografia
ALMANAQUES da cidade do Rio de Janeiro para os anos de 1792 e 1794. Anais da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, Serviço Gráfico do Ministério da Educação, v. 59, p. 188-356, 1937. Publicado em 1940. Disponível em: https://goo.gl/NoHFx2. Acesso em: 2 jul. 2009.

COELHO, Sérgio Veludo. Espingardas e espingardeiros alemães nos arsenais reais nacionais (1806-1814). Revista Militar, Lisboa, n. 2.508, jan. 2011. Disponível em: https://goo.gl/f9RpJZ. Acesso em: 13 jun. 2012.

CRUZ, José de Sousa Pereira da. Acontecimentos da fortaleza da Conceição do Rio de Janeiro, 1844. Revista do IHGB, Rio de Janeiro, v. 25, p. 453-458, 1862.

NUNES, António Pires. Quadros da vida militar: das ordenações sebásticas às invasões francesas. In: BARATA, Manuel Themudo; TEIXEIRA, Nuno Severiano (dir.).Nova história militar de Portugal. v. 5. Lisboa: Círculo de Leitores, 2004. p. 45-98.

PONDÉ, Francisco de Paula e Azevedo; TAPAJÓS, Vicente. Organização e administração do Ministério da Guerra no Império. Brasília: Fundação Centro de Formação do Servidor Público; Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1986. (História Administrativa do Brasil, v. 16).

WEHILING, Arno; WEHLING, Maria José. Exército, milícias e ordenanças na corte joanina: permanências e modificações. DaCultura, Rio de Janeiro, ano VIII, n. 14, p. 26-32, jun. 2008. Disponível em: https://goo.gl/6orMhY. Acesso em: 15 jan. 2010.


Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_2H Diversos SDH - Caixas


Referência da imagem
Encyclopédie, ou, Dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers, par une société de gens de lettres. Paris: Briasson, 1751-1780. Arquivo Nacional, OR_1896_V1_ PL07