As intendências do Ouro foram estabelecidas pelo decreto de 28 de janeiro de 1736 para a execução do sistema de capitação, um modelo de tributação implementado na colônia naquele momento (Registro…,1736).
Após a descoberta do ouro em terras brasileiras, Portugal instituiu várias medidas de caráter fiscalizador com o chamado “Primeiro regimento das terras minerais”, de 15 de agosto de 1603, seguido por inúmeros outros regimentos, instruções e leis, que tinham o objetivo de controlar a arrecadação dos direitos reais. A nova dinâmica econômica que se impôs pela descoberta do mineral influenciou a própria configuração do território colonial. Em 1608, a região que compreendia as capitanias de São Vicente, Espírito Santo e Rio de Janeiro foi separada do restante da colônia e dotada de um governo autônomo, que durou até 1612. Em 1709, foi estabelecida a capitania de São Paulo e Minas do Ouro, que seria dividida em duas em 1720. A última intervenção foi o deslocamento da sede do governo-geral de Salvador para o Rio de Janeiro, em 1763.
A organização administrativa das minas tomou maior impulso entre o final do século XVII e início do século XVIII, quando foram instituídos os provedores de registro que, funcionando como alfândegas internas, proibiam a passagem de pessoas que transportassem ouro sem a guia fornecida pelas autoridades e cobravam a entrada no território das minas. Em 1702, o alvará de 19 de abril reformulou as antigas provedorias das Minas, transformando-as em superintendências, e regulou a demarcação das datas, ou seja, das propriedades territoriais destinadas à exploração mineral (Salgado, 1985, p. 85-89).
O sistema de tributação também passou por diversas mudanças. Entre 1700 e 1713, foi cobrado o quinto, antiga instituição portuguesa que correspondia à arrecadação do direito real de 20% sobre o ouro encontrado. A partir de 1714, a população reivindicou a estipulação de uma taxa fixa e o quinto foi abolido. Em 1719, essa nova cobrança foi extinta, mas o quinto seria restabelecido somente em 1725. Posteriormente, na década de 1730, instituiu-se a cobrança da capitação, que consistia no pagamento de 4 ¾ de oitava de ouro, ou cerca de 17 gramas de ouro em pó, para cada pessoa escravizada residente na região das minas (Renger, 2006, p. 100; Salgado, 1985, p. 90-91).
A fundação das intendências do Ouro representou, portanto, o estabelecimento de mecanismos administrativos regionalizados, com a finalidade de agilizar a arrecadação e evitar os descaminhos do ouro. Inicialmente, foram instituídas intendências em Cuiabá, Goiás, Paranaguá, Paranapanema, Ribeirão, Rio das Mortes, Sabará, Serro Frio, Vila Rica e nas Minas do Arassuã, na Bahia.
Com a restauração da arrecadação do quinto e o fim da capitação, pelo alvará de 3 de dezembro de 1750, as intendências passaram a funcionar junto às Casas de Fundição , sendo inspecionadas pelos Intendentes-gerais do Ouro. De acordo com o alvará de 4 de março de 1751, nas intendências se pesaria o ouro em pó e se tiraria o quinto, que seria guardado em um cofre. Após o registro da quantidade de ouro pertencente à pessoa, e de sua fundição, seriam entregues guias para posterior controle e fiscalização (Salgado, 1985, p. 83-90).
Originalmente, o regimento da capitação de 1735 previu que as intendências seriam compostas pelo intendente, fiscal, escrivão, tesoureiro, meirinho e ajudante de escrivão. Um ano depois, o decreto de sua criação acrescentou o cargo ensaiador. Em 1751, o órgão passou a contar, em sua estrutura, com meirinhos e escrivães do intendente e do fiscal, escrivães da receita, da Intendência e das fundições, dois fundidores e seus ajudantes.
Com a transferência da corte para o Brasil, em 1808, algumas medidas foram tomadas no sentido de controlar com mais eficiência a circulação do ouro. Nas intendências, reforçaram-se as ordens de fiscalização, principalmente na prática de permuta. Diante da diminuição da extração do ouro, o governo determinou a extinção dos lugares de intendentes, primeiro em Goiás e depois em São João del Rei, Vila do Príncipe, Sabará, Vila Rica e Serro Frio, que foram substituídos, gradativamente, pelos juízes de fora. Em 1832, as intendências e casas de fundição foram abolidas pela lei de 24 de outubro.
Angélica Ricci Camargo
Jan. 2013
Fontes e bibliografia
DECRETO de criação e regulamentação das intendências, para recolhimento da capitação e censo nas capitanias de Minas Gerais, São Paulo e Bahia, de 28 de janeiro 1736. Arquivo Nacional, Fundo Relação da Bahia, 1527-1800, códice 445, v. 9, BR_RJANRIO_83_COD.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Metais e pedras preciosas. In: ______ (org.). História geral da civilização brasileira. t. 1: A época colonial. v. 2: Administração, economia e sociedade (1500-1822). 5. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Difel, 1976. p. 259-310.
LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. Processo administrativo ibero-americano: aspectos socioeconômicos, período colonial. São Paulo: Biblioteca do Exército, 1962.
MAGALHÃES, Beatriz R. de. Capitação. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994. p. 130-131.
PORTUGAL. Alvará de 3 de dezembro de 1750. Regimento para a nova cobrança do direito senhorial dos quintos dos moradores das Minas Gerais, abolida a capitação, que antes se praticava. Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1750-1762, Lisboa, p. 21-28, 1830. Disponível em: https://goo.gl/BAVEuc. Acesso em: 4 jun. 2007.
______. Alvará de 4 de março de 1751. Regimento das intendências e casas de fundição. Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1750-1762, Lisboa, p. 40-51, 1830. Disponível em: https://goo.gl/BAVEuc. Acesso em: 4 jun. 2007.
REGISTRO do regimento da capitação, de 26 de setembro de 1735. Arquivo Nacional, Fundo Relação da Bahia, Registro de Cartas Régias, 1590-1781, códice 538, v. 3, p. 21, BR_RJANRIO_83_COD.
RENGER, Friedrich. O quinto do ouro no regime tributário nas Minas Gerais. Revista do Arquivo Público Mineiro, ano XLII, p. 90-105, jul./dez. 2006. Disponível em: https://goo.gl/sUZ1BW. Acesso em: 4 maio 2008.
SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_NP Diversos Códices SDH
BR_RJANRIO_0M Casa dos Contos
BR_RJANRIO_22 Decretos do Executivo - Período Imperial
Referência da imagem
Johann Moritz Rugendas. Voyage pittoresque dans le Brésil. Paris: Engelmann & Cie., 1835. Arquivo Nacional, OR_2119_DIV1_PL_22