O Regimento Policial da Capital Federal, também denominado Brigada Policial da Capital Federal, Força Policial do Distrito Federal ou Polícia Militar do Distrito Federal, foi criado pelo decreto de 22 de outubro de 1831 sob a denominação de Corpo de Guardas Municipais Permanentes da Corte, tendo por atribuição manter a tranquilidade pública e auxiliar a Justiça (Brasil, 1857a, art. 1º). No entanto, a instituição de uma força policial militarizada no Rio de Janeiro remonta aos primeiros anos do século XIX, quando foi criada pelo decreto do príncipe regente de 13 de maio de 1809 a Divisão Militar da Guarda Real de Polícia da Corte, subordinada ao intendente-geral da Polícia da Corte e do Estado do Brasil, com objetivo de suprir a escassez de pessoal para o cumprimento das determinações referentes ao policiamento urbano.
O estabelecimento da Divisão Militar esteve atrelado às transformações por que passou a cidade a partir da transferência da sede da monarquia portuguesa, em 1808. A cidade colonial, agora capital, ganharia novos ares a partir da criação de importantes instituições – escolas de marinha, guerra, comércio e de medicina, Jardim Botânico, Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, Teatro Real e do Banco do Brasil –, do crescimento da sua população e do desenvolvimento das atividades comerciais e financeiras.
Nesse contexto, coube à Guarda Real o patrulhamento das ruas, em especial à noite, devendo garantir, principalmente, a ordem pública nos trapiches, nas docas e alfândegas, nos mercados de escravos e de produtos alimentícios e, também, nos locais de sociabilidade propícios à reunião de indivíduos pertencentes às camadas pobres e escravos. As companhias de infantaria e cavalaria foram aquarteladas em pontos estratégicos para permitir a vigilância da cidade e seu perímetro urbano.
Comandada pelo oficial de 1ª linha Miguel Nunes Vidigal, a Guarda Real ganhou notoriedade à época devido à truculência do policiamento ostensivo efetuado por seus granadeiros – ou soldados de infantaria – na repressão aos escravos e capoeiras. Na década de 1820, as autoridades policiais obtiveram o direito legal de punir os praticantes da capoeiragem – tanto escravos como homens livres – empregando os açoites para castigá-los no ato de suas prisões. Cabe ressaltar que a Guarda Real notabilizou-se ainda pela captura de escravos fugidos e pela destruição dos quilombos dos Morros do Desterro e de Santa Teresa naquela mesma década. Encarregou-se ainda de perseguir os praticantes das religiões africanas, como o candomblé (Corpo..., 2015; Silva, 1981, p. 24-5).
A Guarda Real foi extinta em 1831 em decorrência da sublevação de suas unidades contra o governo após a abdicação de d. Pedro I, no dia 7 de abril, sendo substituída pelo Corpo de Guardas Municipais Permanentes da Corte. Incumbida de realizar o policiamento urbano através do patrulhamento nas ruas da cidade, os ‘permanentes’ – nome pelo qual ficaram conhecidos os policiais militares da capital – possuíam, entre outras, a atribuição de atuar na repressão às reuniões ilícitas – sem a devida permissão das autoridades policiais – controlar a população que afluía aos eventos públicos autorizados, prender os indivíduos que perturbassem a ordem pública, os que portassem armas e os que ofendessem a moral então estabelecida. Ficaram a cargo ainda dos permanentes uma série de incumbências rotineiras tais como a vigilância dos chafarizes e fontes e a prisão de bêbados e mendigos. Atuaram ainda como força armada, combatendo os opositores do regime e em casos de guerra (Corpo..., 2015).
Em 1858, por meio do decreto n. 2.081, de 16 de janeiro, o Corpo de Guardas Municipais passou a se chamar Corpo Policial da Corte. E, em 1866, o decreto n. 3.598, de 27 de janeiro, reorganizou essa força policial, dividindo-a em dois corpos, um militar e outro civil, ou paisano, que ficou subordinado ao chefe de Polícia, denominado Guarda Urbana.
Em 1885, o Corpo Policial da Corte passou a se chamar Corpo Militar de Polícia da Corte e, conforme o regulamento, baixado pelo decreto n. 10.222, de 5 de abril de 1889, sua ação abrangeria todo o município neutro, sendo destinado a velar pela segurança pública, pela manutenção da ordem e pela execução das leis. Incumbia-lhe ainda o patrulhamento uniformizado de rua por meio das patrulhas ou rondas nos postos ou estações que lhe fossem designados. As praças que faziam as rondas ou patrulhas possuíam uma gama de atribuições, tais como a prisão de quaisquer indivíduos suspeitos de haverem cometido crimes ou roubos, devendo levá-los à presença do comandante do posto, efetuar a prisão de bêbados e mendigos, zelar pelo cumprimento das posturas municipais, prestar auxílio à população entre tantas outras ocorrências rotineiras (Brasil, 1889, art. 51).
Ao final do Segundo Reinado (1840-1889), a polícia militar já havia se transformado num instrumento de coerção nas mãos do Estado, atuando não só nas tarefas ligadas ao policiamento urbano, mas também como força armada no combate aos opositores do regime e, em casos de guerra, como auxiliar do Exército.
Desde o último quartel do século XIX, o serviço policial da cidade do Rio de Janeiro vinha sendo objeto de reorganizações de cunho científico-positivista conduzidas por uma elite composta, entre outros, por magistrados e agentes ligados à área de segurança e manutenção da ordem pública. As ideias provenientes da nova criminologia e das ciências penais em voga no continente europeu circulavam entre a elite intelectual da capital. Essas reformas visavam, ainda, atender às necessidades de uma cidade que desde o final da década de 1870 vinha sofrendo alterações estruturais, tais como o crescimento demográfico, devido em parte à imigração estrangeira, e ao fim da escravidão. Além disso, logo após a Proclamação da República, a cidade virou palco de uma onda de turbulência que só cederia no final da primeira década do século XX (Bretas, 1977b, p. 43-4; Carvalho, 1987, p. 15).
Nessa fase inicial de consolidação do novo regime, o governo executou uma reforma da força policial militar da capital que passaria a ser denominado Regimento Policial da Capital Federal, sob as ordens imediatas do ministro dos Negócios da Justiça e do chefe de Polícia, por meio do decreto n. 155, de 14 de janeiro de 1890. O regimento foi dividido em quatro corpos, composto por 1075 praças e oficiais, sendo um de cavalaria, e três batalhões de infantaria com as designações de 1º, 2º e 3º, que seguiam a mesma organização dos do Exército. Nesse mesmo ano, o regimento foi elevado à condição de brigada, consistindo numa unidade militar composta por regimentos ou batalhões comandados por um general de brigada ou coronel do Exército, ficando agora sob as ordens imediatas do ministro da Justiça. Essa pronta intervenção do governo republicano seguiu em certa medida as exigências das transformações que o serviço policial já vinha sofrendo desde a década de 1860, mas mostrava também a proeminência da nova ordem que então se instaurava (Brasil, 1890a, p. 48; Brasil, 1890b).
A Brigada Policial da Capital Federal foi regulamentada pelo decreto n. 958, de 6 de novembro de 1890, sendo incumbida de velar pela segurança pública, manter a ordem e executar as leis, por meio dos respectivos corpos aquartelados em diversas freguesias, cuja ação compreendia todo o distrito da capital federal. O governo podia ainda convocar a brigada para auxiliar nas operações do Exército em caso de guerra. O policiamento militar continuaria a ser realizado por meio de patrulhas ou rondas, às quais competia prender e conduzir imediatamente à presença do comandante de estação ou do seu posto os evadidos das prisões, os desertores e os que portassem instrumentos próprios para a prática do roubo. Cabia-lhes, ainda, conduzir às respectivas estações os que portassem armas proibidas pelas posturas municipais, os que danificassem edifícios ou obras públicas, os contrabandistas, os bêbados, os alienados mentais e os mendigos, as crianças perdidas e os que por suas vestimentas ofendessem a “moral e os bons costumes”. Incumbia-lhes, igualmente, acudir a população em casos de incêndios, notificar às autoridades a existência de pessoas mortas, enfermas ou abandonadas nas ruas e praças, e reprimir algazarras nas tabernas e botequins (Brasil, 1891, artigos 6º e 93).
A brigada foi formada por um regimento de cavalaria e três batalhões de infantaria, com a numeração de 1º, 2º e 3º, sendo composta inicialmente por 2010 indivíduos oficiais e praças, que seriam escolhidos preferencialmente entre os ex-praças do Exército, da Armada e do Corpo de Bombeiros. A composição dos corpos foi feita por meio do recrutamento voluntário entre os cidadãos brasileiros ou estrangeiros, com mais de 18 anos e menos de 45, que falassem a língua portuguesa, desde que seu contingente não excedesse a um terço do pessoal efetivo, e o período de engajamento durava três anos.
Durante o governo Campos Sales (1898-1902), a política de contenção orçamentária reduziu o efetivo da força militar, mas seu treinamento e sua seleção foram aprimorados, reduzindo a idade máxima para o recrutamento de 45 para 40 anos, e passava a exigir também a alfabetização conforme o decreto n. 4.272, de 11 de dezembro de 1901. Nesse regulamento ficava previsto que a Brigada, embora fosse diretamente subordinada ao ministro da Justiça, estaria à disposição das autoridades policiais para o serviço que estas requisitassem em nome da ordem e da segurança pública no Distrito Federal. No quadriênio Rodrigues Alves (1902-1906), houve o crescimento do efetivo devido aos enfrentamentos entre o governo e a população quando da primeira greve geral na capital federal, em 1903, e da Revolta da Vacina, em 1904 (Bretas, 1997b, p. 45). Desde o primeiro regulamento de 1890, já havia ficado determinado que, em casos de guerra, o governo poderia convocar a brigada para auxiliar o Exército em suas operações. Tal determinação também constou do texto do decreto n. 1.263-A, de 10 de fevereiro de 1893. Nesse mesmo ano, portanto, a brigada ficou então à disposição do Ministério da Guerra devido às rivalidades entre o Exército e a Marinha, que desembocaram na Revolta da Armada, iniciada no Rio de Janeiro em 1893. Foi somente no regulamento de 1910 que esse texto foi alterado passando a incluir, ao lado dos casos de guerra externa, o de guerra interna.
Em 1905, a brigada passou a se chamar Força Policial do Distrito Federal, ficando subordinada ao ministro da Justiça, mas ficaria à disposição das autoridades policiais para garantir a ordem e a segurança pública no Distrito Federal (Brasil, 1907).
Foi por meio do decreto n. 14.477, de 17 de novembro de 1920, que a Brigada Policial do Distrito Federal passou a se chamar Polícia Militar do Distrito Federal, cujo regulamento foi aprovado pelo decreto n. 14.508, de 1º de dezembro de 1920. A polícia militar passou a contar com um Estado-Maior, cinco batalhões de infantaria, um regimento de cavalaria e uma companhia de metralhadoras, organizada com oficiais e praças dos corpos de infantaria. E, ainda, Assistência do Pessoal, Contadoria, Intendência-Geral, serviços de Saúde, de Engenharia e de Eletricidade e Iluminação, Corpo de Serviços Auxiliares e Conselho Administrativo. A polícia militar, subordinada diretamente ao ministro da Justiça, foi constituída como uma força auxiliar do Exército ativo, mas estaria ainda à disposição das autoridades policiais para quaisquer serviços que fossem requisitados para garantir a ordem e a segurança pública. Nessa mesma década de 1920 foi criada a Escola Profissional para Formação de Oficiais.
No primeiro regulamento da década de 1930, baixado pelo decreto n. 22.587, de 28 de março de 1933, a polícia militar passava a integrar a força auxiliar do Exército ativo e ficava à disposição das autoridades policiais para quaisquer serviços que lhe fossem requisitados, relacionados à manutenção da ordem e da segurança pública no Distrito Federal. A partir da Constituição de 1934, a polícia militar passou a ser considerada uma reserva do Exército, e quando estivessem mobilizadas em prol da segurança nacional ou a serviço da União, gozaria das mesmas vantagens atribuídas àquela força militar (Brasil. Constituição (1934), art. 167). Dois anos depois, a lei n. 192, de 17 de janeiro, que reorganizou as polícias militares nos estados e na União, já consideradas reservas do Exército pelo texto constitucional de 1934, estabeleceu que as forças militares devessem exercer as funções de vigilância e garantia da ordem pública, garantir o cumprimento da lei, da segurança das instituições e do exercício dos Poderes constituídos e atender à convocação do governo federal em casos de guerra externa ou grave comoção intestina conforme a lei de mobilização. Foi nessa década que ficou estabelecida a associação entre segurança pública interna e segurança nacional, levando à subordinação da polícia militar ao Exército.
Gláucia Tomaz de Aquino Pessoa
Set. 2018
Fontes e bibliografia
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Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_22 Decretos do Executivo – Período Imperial
BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo – Período Republicano
BR_RJANRIO_OI Diversos GIFI – Caixas e Códices
BR_RJANRIO_4T Ministério da Justiça e Negócios Interiores
BR_RJANRIO_0E Polícia da Corte
BR_RJANRIO_8M Série Agricultura – Administração (IA2)
BR_RJANRIO_9V Série Guerra – Quartéis (IG8)
BR_RJANRIO_AF Série Justiça – Administração (IJ2)
BR_RJANRIO_AM Série Justiça – Polícia – Escravos – Moeda Falsa – Africanos (IJ6)
Referência da imagem
Fotografias Avulsas. BR_RJANRIO_O2_0_FOT_441_13
Este verbete refere-se apenas à trajetória do órgão no período da Primeira República. Para informações entre 1822-1889, consulte Corpo de Guardas Municipais Permanentes da Corte