O Conselho da Defesa Nacional foi criado pelo decreto n. 17.999, de 29 de novembro de 1927, com a finalidade de realizar estudos e coordenar informações sobre todos os assuntos de ordem financeira, econômica, bélica e moral relativos à defesa do país.
Presidido pelo presidente da República, o conselho também era composto pelos ministros da Guerra, Marinha, Fazenda, Viação e Obras Públicas, Agricultura, Indústria e Comércio, Justiça e Negócios Interiores, e Relações Exteriores, e pelos chefes dos estados-maiores do Exército e da Armada. Estava prevista ainda a participação eventual de outras autoridades e de presidentes ou agentes executivos de sociedades, sindicatos, diretores de empresas ou firmas, convocados ou convidados pelo presidente da República.
De acordo com o decreto n. 17.999, o Conselho da Defesa Nacional seria secretariado por dois oficiais do Estado-Maior do Exército e da Armada. Todos os papéis, arquivo e objetos do órgão ficariam sob a guarda do Estado-Maior do Exército, encarregado, ainda, de sua classificação.
O lugar de destaque ocupado pelo Estado-Maior do Exército se vincula à própria gênese do conselho, impulsionada pela chamada Missão Militar Francesa, contratada em 1919 para promover a reformulação do Exército brasileiro. A missão teve como um de seus desdobramentos a reorganização do Estado-Maior e contribuiu para a disseminação de uma nova visão de defesa nacional (Ministério..., 2018; Carvalho, 2006, p. 217).
A ideia de ‘defesa nacional’ foi objeto de variadas construções, inseridas em uma discussão maior a respeito da chamada ‘questão nacional’, que esteve no centro do debate intelectual, especialmente no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Em 1916, foi fundada a Liga de Defesa Nacional, tendo como bandeiras o serviço militar obrigatório e a educação cívico-patriótica da população (Oliveira, 1990, p. 147). No âmbito da organização militar, a noção de ‘defesa nacional’ esteve presente nos projetos de profissionalização do Exército. Compreendida como mobilização de recursos humanos, técnicos e econômicos, que abrangia diversos pontos, da preparação militar ao desenvolvimento de indústrias estratégicas, essa concepção de ‘defesa nacional’ começou a circular com os denominados ‘jovens turcos’, oficiais que haviam estagiado no Exército alemão entre 1906 e 1912, e ganhou maior projeção com a chegada da Missão Francesa (Carvalho, 2006, p. 217).
Em 1913, alguns oficiais egressos do estágio na Alemanha fundaram a revista A Defesa Nacional, dedicada a temas relacionados à corporação militar e à sua profissionalização, mas que também trazia estudos e projetos referentes à organização política interna e externa nacional (Vieira, 2013, p. 44). Dentre as propostas apresentadas pela revista figurou a da criação de um órgão central de planejamento e direção política do país, capaz de avaliar seus recursos militares, elaborar os planos de guerra e promover a organização militar, atuando, ainda, em todos os aspectos da defesa nacional fora da esfera estritamente militar (Vieira, 2013, p. 65; 72).
A campanha realizada pela revista e os trabalhos da Missão Francesa resultaram na instituição do Conselho da Defesa Nacional, que ficou responsável pelo planejamento e mobilização nacional para a defesa, incluindo aspectos econômicos e psicológicos (Vieira, 2013, p. 72; Carvalho, 2006, p. 217). Mais tarde, o órgão se transformaria em um dos “locus de poder do Estado” (Vieira, 2013, p. 72) e de origem do serviço secreto brasileiro (Figueiredo, 2005, p. 37).
Apesar de ter sido criado em 1927, o conselho começou a funcionar efetivamente apenas em 1934 (Lemos, 2014, p. 116). Naquele ano, o decreto n. 23.873, de 15 de fevereiro, criou seções de Defesa Nacional em cada ministério e organizou sua estrutura. A Constituição, promulgada em 16 de julho de 1934, alterou sua denominação para Conselho Superior de Segurança Nacional, além de atribuir ao órgão a deliberação sobre a concessão de terras e vias de comunicação em uma faixa de cem quilômetros ao longo das fronteiras, e sobre o estabelecimento, nessas áreas, de indústrias que interessassem à segurança nacional. Ainda em 1934, o decreto n. 7, de 3 de agosto, modificou novamente sua denominação para Conselho de Segurança Nacional.
Angélica Ricci Camargo
Jul. 2019
Fontes e bibliografia
BRASIL. Decreto n. 17.999, de 29 de novembro de 1927. Providencia sobre o Conselho da Defesa Nacional. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 570, 1928.
CARVALHO, José Murilo de. As Forças Armadas na Primeira República: o poder desestabilizador. In: FAUSTO, Boris (org.). História geral da civilização brasileira. t. 3: O Brasil republicanos. v. 9: Sociedade e instituições (1889-1930). 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. p. 197-257.
FIGUEIREDO, Lucas. Ministério do silêncio: a história do serviço secreto brasileiro de Washington Luís a Lula (1927-2005). Rio de Janeiro: Record, 2005.
LEMOS, Thiago Tremonte de. Desejos de modernidade: o Exército brasileiro e a Missão Francesa de Instrução (1917-1927). Tese (Doutorado em História) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2014.
MINISTÉRIO da Guerra. In: DICIONÁRIO da Administração Pública Brasileira da Primeira República (1889-1930), 2018. Disponível em: https://bit.ly/2LaMgCD. Acesso em: 9 jul. 2019.
OLIVEIRA, Lúcia Lippi. A questão nacional na Primeira República. São Paulo: Brasiliense; Brasília: CNPq, 1990.
VIEIRA, Ricardo Zortéa. Lembrai-vos da guerra: ameaça geopolítica, organização do Estado e desenvolvimento econômico no pensamento militar brasileiro (1913-1964). Dissertação (Mestrado em Economia Política Internacional) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2013.
Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano
Referência da imagem
Arquivo Nacional, Fundo Correio da Manhã, BR_RJANRIO_PH_0_FOT_30651_19