Previous Page  10 / 52 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 10 / 52 Next Page
Page Background

9

criação de tradições, cartas e documentos que validassem direitos

de propriedade específicos. Tal prática também conjugou a produ-

ção de documentos que passaram a ser definidos por sua relação

com o todo, ou seja, a coleção. Esse fenômeno de estabelecimento

de fontes orientou o surgimento de uma nova ciência: a erudição.

O avanço das técnicas de tratamento documental, oriundas desse

processo, veio acompanhado do aperfeiçoamento da crítica docu-

mental. Iniciada na Idade Média como forma de identificar a auten-

ticidade de documentos, aperfeiçoou-se no Renascimento e chegou

ao seu apogeu com os eruditos do século XVI, tendo como marco

fundador a publicação da obra

De re diplomatica

, de Mabillon, em

1681 (Le Goff, 2003, p. 533). Porém, com o surgimento da história-

-ciência no século XIX, a crítica documental ganhou força e o recolhi-

mento de fontes se ampliou a partir de uma perspectiva metódica

de escrita sobre a memória das nações

.

Nesse regime de historici-

dade, os acontecimentos passaram a ser escritos sob o ponto de

vista do futuro, visando ao progresso, e a questão nacional balizou

a produção intelectual. A história adquiriu o caráter de ciência, com

problemas e métodos específicos, e, nesse contexto, os documentos

e os arquivos ganharam novos usos, e o historiador foi se diferen-

ciando do erudito (Koselleck, 2006; Hartog, 2003, p. 24).

No Brasil, a ideia de “construção da nação”, direcionada à civiliza-

ção

7

e ao progresso, orientou os projetos do governo e dos letrados

durante o século XIX. A fundação do Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro (IHGB) em 1838, por exemplo, esteve relacionada ao pro-

cesso de consolidação do Estado nacional através de um projeto

historiográfico voltado para a criação de uma identidade própria e

homogeneizada do Brasil entre as elites, que por sua vez se encar-

regariam de disseminar essa visão de nação para o resto da socie-

7

 De acordo com Nobert Elias (1994, p. 23-24), civilização é um termo complexo

e utilizado para referir-se a diversos fatores, como costumes, religião e

desenvolvimento técnico-científico, adquirindo, todavia, diferentes sentidos entre

as nações. Civilização seria a consciência que o Ocidente tem de si mesmo, através

do conjunto de práticas e atitudes consideradas civilizadas. As nações ocidentais se

julgam superiores às sociedades mais antigas ou sociedades contemporâneas mais

“primitivas” e utilizam o termo civilizado para descrever seus feitos e características

que as tornam especiais, tais como seu desenvolvimento científico e cultural.

Desse modo, as nações menos desenvolvidas buscaram se equiparar ao modelo

de civilização das consideradas mais adiantadas, através de diversas medidas

institucionais, intelectuais e de comportamento.