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Universidade do Rio de Janeiro

Publicado: Quinta, 16 de Março de 2023, 09h53 | Última atualização em Quinta, 16 de Março de 2023, 10h15 | Acessos: 2219
Universidade do Brasil hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro, Praia Vermelha, Rio de Janeiro, década de 1940
Universidade do Brasil hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro, Praia Vermelha, Rio de Janeiro, década de 1940

A Universidade do Rio de Janeiro foi criada pelo decreto n. 14.343, de 7 de setembro de 1920, a partir da reunião da Universidade do Rio de Janeiro, da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, tendo por objetivo “estimular a cultura das ciências, estreitar entre os professores os laços de solidariedade intelectual e moral e aperfeiçoar os métodos de ensino” (Brasil, 1920).

O projeto de instituição de uma universidade no Brasil remonta ao período colonial, ainda que não tenha sido autorizado pela metrópole portuguesa, em decorrência do seu papel de colônia, o que obrigava os membros da elite local a realizarem estudos na Europa, notadamente na Universidade de Coimbra, em Portugal. A partir de 1808, com a transferência da família real para o Rio de Janeiro, houve a instalação de uma ampla e complexa estrutura administrativa para adequar o Brasil às novas exigências políticas e econômicas, fruto da transformação da então colônia em sede da monarquia portuguesa. Foram criadas inúmeras instituições científicas e de ensino, como as escolas de medicina do Rio de Janeiro e da Bahia (1808), a Real Academia dos Guardas-Marinhas (1808), a Academia Real Militar (1810), o Curso de Agricultura da Bahia (1812) e a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios (1816). Nesse período, o ensino superior no Brasil não seria organizado sob a forma universitária e não esteve imbuído dos valores da alta cultura e da produção de conhecimento científico, mas voltado para a formação de profissionais, numa perspectiva prática e imediatista (Teixeira, 1989).

Foi após a independência brasileira que a questão da formação de quadros assumiu novos contornos. O desafio de reorganização de estruturas burocráticas que respondessem pela expedição dos assuntos antes pertencentes à administração portuguesa colocava o ensino superior no centro desse debate (Cabral; Camargo, 2017, p. 10). No entanto, o modelo adotado ao longo do Império também não seria o da universidade – apesar dos inúmeros projetos apresentados e discutidos na Legislativo, inclusive o de José Bonifácio e o de Rui Barbosa, mas de escolas isoladas (Teixeira, 1989). O ensino superior manteria o perfil segmentado e utilitário, com a constituição de novas escolas superiores profissionais, como os cursos jurídicos de São Paulo e Olinda (1828) ou a Escola de Minas de Ouro Preto (1876).

Após a República, a questão do ensino superior seria tratada na Constituição de 1891, que definiu a repartição de atribuições entre os entes federados, resultado do regime dual de competências imposto pelo federalismo. As ações da União e governos locais seriam cumulativas, cabendo à primeira o ensino superior, de forma não exclusiva, e o primário e secundário do Distrito Federal, em colaboração com o poder municipal. Aos estados competia tudo que não estivesse na alçada da União, ou seja, a organização do ensino primário e secundário, bem como o ensino superior, o que ocorreria às suas expensas.

Na verdade, a Constituição de 1891 mantivera a descentralização administrativa iniciada com o Ato Adicional de 1834, que atribuiu às assembleias estaduais autonomia de legislar sobre uma gama variada de assuntos, como a instrução pública e os estabelecimentos próprios, salvo as faculdades de medicina, os cursos jurídicos, as academias existentes e quaisquer estabelecimentos de instrução que, no futuro, fossem criados por lei geral (Brasil, 1834, art. 10, § 2º).

Foi nas décadas finais do século XIX que o debate acerca do papel da educação para o progresso e a modernização do país ganhou destaque entre autoridades, políticos e intelectuais, e temas como a ampliação da escolarização, laicidade, ensino obrigatório e gratuito apontavam para a necessidade de uma reforma do ensino. A transição do Império para a República, com o avanço do ideário positivista e do movimento republicano, colocou a educação como uma importante ferramenta para romper com o atraso do país. Associada ao progresso e civilização, a educação assumia nesse discurso um papel regenerador. Nesse sentido, entre 1879 e 1925, uma série de reformas educacionais foram aprovadas, e ficariam conhecidas pelo nome do titular do ministério a que estavam subordinados os assuntos relativos à educação.

Em 1879, foi aprovada a Reforma Leôncio de Carvalho, pelo decreto n. 7.247, de 19 de abril, em que o governo imperial reorganizou e tornou livres os ensinos primário e secundário no município da corte e o superior nas províncias, incentivando a criação de escolas particulares. No ensino superior, a reforma conferia liberdade de frequência aos alunos e autorizava o funcionamento das faculdades livres mantidas por associações de particulares, que ficavam sujeitas apenas à fiscalização das condições de moralidade e higiene. Nas duas primeiras décadas da República, foram realizadas outras reformas, que pretenderam estabelecer a organização e o funcionamento do ensino nos diferentes níveis, como forma de enfrentar as diferenças locais e oferecer uma orientação nacional à educação. Assim, tivemos as reformas Benjamin Constant (1890), Epitácio Pessoa (1901), Rivadávia Correia (1911), Carlos Maximiliano (1915) e João Luís Alves (1925).

No caso específico do ensino superior, três reformas tiveram especial relevância: Benjamin Constant, Rivadávia Correia e Carlos Maximiliano. A reforma empreendida por Benjamin Constant, ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos do governo Deodoro da Fonseca (1889-1891), estabeleceu a eliminação paulatina dos exames preparatórios, o que pretendia ampliar o acesso ao ensino superior, além de permitir a concessão de diplomas por escolas superiores particulares, equiparados aos expedidos pelas faculdades federais, permitindo o avanço daquelas instituições. Em 1911, a reforma implementada pelo ministro da Justiça e Negócios Interiores Rivadávia Correia, no governo do presidente Hermes da Fonseca (1910-1914), instituiu o ensino livre, de acordo com o ideário liberal e positivista. Nesta reforma, o Estado abdicava da função de interferência no ensino público, equiparando as escolas de instrução fundamental e superior públicas às privadas, do ponto de vista didático e administrativo (Palma Filho, 2005). Essa reforma propiciou o avanço das escolas privadas, bem como o surgimento de universidades nos estados, como as de Manaus (1909), São Paulo (1911) e Paraná (1912) (Fávero, 2006, p. 21).

A reforma empreendida em 1915, pelo ministro da Justiça e Negócios Interiores Carlos Maximiliano, no governo do presidente Venceslau Brás (1914-1918), reorganizou o ensino secundário e o superior, e retomou a ideia de universidade. Caracterizada pelo retorno da centralização do ensino, que havia sido eliminada na reforma educacional de 1911 (Bomeny, 1993), a reforma dispôs sobre a instituição de uma universidade, a partir da reunião das escolas politécnicas com a de Medicina do Rio de Janeiro, incorporando ainda uma das faculdades livres de direito existentes no Rio de Janeiro, quando se julgasse oportuno (Brasil, 1815).

A reforma criou condições para fusão das duas faculdades livres que funcionavam na capital, a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro (1882) e a Faculdade Livre de Direito do Rio de Janeiro (1891), o que ocorreria em 24 de abril de 1920, com a denominação de Faculdade de Direito do Rio de Janeiro (Alves, 2021, p. 506). Mas seria somente em 1920 que se efetivaria a criação da primeira universidade pública federal, sem que sua instituição tivesse sido “acompanhada de amplos debates e discussões” (Fávero, 2010, p. 32).

O decreto de criação da universidade dispunha que sua direção caberia ao presidente do Conselho Superior do Ensino, na qualidade de reitor, e ao Conselho Universitário, com as atribuições que previstas em seu regimento. O Conselho Universitário seria constituído pelo reitor, com voto de qualidade, pelos diretores da Escola Politécnica e das faculdades de Medicina e de Direito, e mais seis professores catedráticos, sendo dois de cada congregação, eleitos em votação secreta e por maioria absoluta de votos (Brasil, 1920, art. 2º, § 2º). Ficava assegurada a autonomia didática e administrativa da Escola Politécnica e das faculdades de Medicina e Direito do Rio de Janeiro, o que foi garantido pelo decreto n. 14.572, de 23 de dezembro de 1920, que aprovou seu regimento.

A criação da Universidade do Rio de Janeiro esteve integrada em um cenário no qual a saúde pública e a educação estiveram identificadas como graves problemas nacionais, que atrelavam o país a um cenário de atraso econômico, um obstáculo a um projeto de modernização defendido pelas elites políticas. As precárias condições sanitárias da população brasileira, abandonada pelo poder público, a presença das doenças endêmicas e o analfabetismo dariam origem a importantes movimentos, como a Liga Pró-Saneamento do Brasil (1918), tendo à frente o sanitarista Belisário Pena, e a Liga Brasileira Contra o Analfabetismo (1915), sob a presidência de Antônio Ennes de Sousa, que expandiu sua atuação aos estados. A década de 1920 foi ainda um período marcado por discussões sobre novas metodologias de ensino, sendo a mais importante a que ficaria conhecida sob a denominação de Escola Nova, que agregaria nomes como Fernando de Azevedo, Lourenço Filho e Anísio Teixeira, levando também à criação da Associação Brasileira de Educação (1924) (Menezes, 2001; Bomeny, 1993).

No caso da Universidade do Rio de Janeiro, é importante assinalar dois aspectos de sua criação: manteve-se a tradição das escolas superiores profissionais e a ideia de universidade ainda não se consolidara, tendo sido assegurada em seu regimento a autonomia didática e administrativa das faculdades reunidas, sem proposição de maior integração entre os cursos. Tanto no decreto que a criou, como no regimento interno, a pesquisa científica não foi considerada uma atividade-fim na Universidade do Rio de Janeiro. Além disso, os cursos existentes eram fisicamente distantes e não se relacionavam academicamente.

Essa forma de organização gerou muitas críticas e um acalorado debate em torno do modelo universitário a ser adotado no Brasil, encabeçado, sobretudo, pela Associação Brasileira de Educação (ABE) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) (Fávero, 2006, p. 22-23; Paula, 2002). As discussões acerca do que deveria ser a universidade brasileira atravessaram os anos de 1920 divididas entre os que defendiam que a formação profissional era a função mais importante, modelo que vigorava na recém-criada universidade da capital; os que acreditavam que o desenvolvimento da pesquisa científica tinha o mesmo peso que a profissionalização; e os que acrescentavam a essa concepção a ideia de que a universidade deveria ser um foco de cultura e disseminação de saber (Fávero, 2006, p. 23).

O decreto n. 16.782-A, de 13 de janeiro de 1925, conhecido como Lei Rocha Vaz, implementou a última reforma no ensino secundário e superior na Primeira República, além de criar o Conselho Nacional do Ensino e o Departamento Nacional de Ensino. O decreto consolidou as medidas já estabelecidas pela reforma Carlos Maximiliano, especialmente no ensino secundário, e manteve a organização da Universidade do Rio de Janeiro.

A reforma alterou a estrutura da universidade, que passava a incorporar as faculdades de Farmácia e de Odontologia, então criadas (Brasil, 1926, art. 259, § 1). O ato previa ainda que poderiam ser estabelecidas, nos mesmos moldes da do Rio de Janeiro, universidades nos estados de Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo. A criação de universidades ficava condicionada a acordos com os governos estaduais, que deveriam concorrer com patrimônio em títulos da dívida pública para o custeio, dispensada a subvenção da União para as faculdades não oficiais. As universidades deveriam possuir um patrimônio em edifícios e instalações de, no mínimo, três mil contos de réis. Uma vez estabelecida a universidade, as faculdades equiparadas que viessem a integrá-las ficavam oficializadas (Brasil, 1926, art. 260).

 

Dilma Cabral
Louise Gabler
Fev. 2022

 

Fontes e bibliografia

ALVES, Alexandre Ferreira Assumpção. A “criação” da Faculdade de Direito da UFRJ (FND) e o ensino jurídico no Brasil em 1891: estudo analítico de aspectos da Reforma Benjamin Constant referentes às faculdades livres. Revista Estudos Institucionais, v. 7, n. 2, p. 505-536, mai./ago. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3E37Cdy. Acesso em: 4 abr. 2022.

BOMENY, Helena. Novos talentos, vícios antigos: os renovadores e a política educacional. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 6, n. 11, p. 24-39, 1993. Dossiê “Os anos 20”. Disponível em: https://bit.ly/3DZ864H. Acesso em: 11 abr. 2022.

BRASIL. Lei n. 16, de 12 de agosto de 1834. Faz algumas alterações e adições à Constituição Política do Império, nos termos da lei de 12 de outubro de 1832. Coleção de leis do Império do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 15, 1834.

______. Decreto n. 11.530, de 19 de março de 1915. Reorganiza o ensino secundário e o superior na República. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 19 mar. 1915. Seção 1, p. 2.977-2.986.

______. Decreto n. 14.343, de 7 de setembro de 1920. Institui a Universidade do Rio de Janeiro. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 7 set. 1920. Seção 1, p. 15.115.

______. Decreto n. 14.572, de 23 de dezembro de 1920. Aprova o regimento da Universidade do Rio de Janeiro. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, p. 1.352-1.356, 1921.

______. Decreto n. 16.782-A, de 13 de janeiro de 1925. Estabelece o concurso da União para a difusão do ensino primário, organiza o Departamento Nacional de Ensino, reforma o ensino secundário e o Superior. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 20-96, 1926.

CABRAL, Dilma; CAMARGO, Angélica Ricci. Estado e administração: a corte joanina no Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2010.

FÁVERO, Maria de Lourdes de Albuquerque. Universidade do Brasil: das origens à construção. 2. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3upgWpi. Acesso em: 8 abr. 2022.

______. A Universidade no Brasil: das origens à Reforma Universitária de 1968. Educar, Curitiba, n. 28, p. 17-36, 2006.

GOMES, Ângela de Castro. A escola republicana: entre luzes e sombras. In: GOMES, Ângela de Castro; PANDOLFI, Dulce; ALBERTI, Verena. A República no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, CPDOC/FGV, 2002. p. 385-437.

MENEZES, Ebenezer Takuno de. Escola Nova. In: Dicionário Interativo da Educação Brasileira - EducaBrasil. São Paulo: Midiamix Editora, 2001. Disponível em: https://bit.ly/3xjibbb. Acesso em: 11 abr. 2022.

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PAULA, Maria de Fátima Costa de. USP e UFRJ: a influência das concepções alemã e francesa em suas fundações. Tempo Social: Revista de Sociologia da USP, São Paulo, n. 14, out. 2002. Disponível em: https://bit.ly/3t5N9jk. Acesso em: 23 fev. 2022.

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Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_OO Afonso Pena Júnior

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

BR_RJANRIO_95 Série Educação - Ensino Superior (IE3)

 

Referência da imagem

Arquivo Nacional. Fundo Correio da Manhã. BR_RJANRIO_PH_0_FOT_1073_32

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