Previous Page  18-19 / 244 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 18-19 / 244 Next Page
Page Background

Guia da administração brasileira:

império e governo provisório |

16

17

|

Guia da administração brasileira:

império e governo provisório

As reformas na Fazenda Nacional tiveram início com a aprovação, em 15 de

dezembro de 1830, da primeira lei de orçamento, que baliza a tentativa do

governo imperial em discriminar as rendas e despesas a cargo da administra-

ção central e das províncias.

9

Mas, foi a reforma de 1831 a primeira a realizar

uma mudança mais orgânica em toda uma área de governação, obedecendo à

estruturação hierarquizada da administração, o que significou alterações em

seu órgão central e nos congêneres provinciais, e também na forma como se

processaria a relação entre essas duas instâncias de poder. Foram reestrutu-

rados o Tesouro Nacional e as juntas de Fazenda, que passaram a se chamar,

respectivamente, Tesouro Público Nacional e tesourarias provinciais. O Con-

selho da Fazenda foi extinto, ficando sua esfera contenciosa a cargo dos juízes

territoriais, cabendo ao próprio Tesouro Público toda jurisdição voluntária

de objetos como habilitações, ordenados, tenças, pensões, assentamentos dos

próprios nacionais, dos contratos das rendas públicas e da expedição de títulos

ou diplomas a todos os oficiais de Fazenda subordinados ao órgão.

10

Mas outros aspectos igualmente importantes para a administração imperial

foram definidos pela lei de 1831, como o ordenado dos ocupantes de todos

os cargos do Tesouro e das tesourarias provinciais, assim como a forma de in-

gresso dos novos empregados, cuja contratação pela administração fazendária

se faria exclusivamente por meio de concurso. Eram critérios de admissão o

conhecimento dos princípios de gramática da língua nacional, da escrituração

por partidas dobradas, do cálculo mercantil, boa letra, boa conduta moral e

idade igual ou superior a 21 anos, preferindo-se os casados aos solteiros. O

acesso aos cargos de oficiais se daria em situação de igualdade de merecimen-

to, mediante aptidão profissional e antiguidade. No caso de empate, a prefe-

rência seria pelos mais aptos.

No caso da organização fazendária, observamos uma expansão de sua estru-

tura, com a criação de mais um nível hierárquico. Assim, conforme a lei de 4

de outubro de 1831, o núcleo administrativo da Secretaria de Fazenda era o

Tesouro Nacional. As decisões sobre as matérias referentes aos assuntos fazen-

dários eram tomadas pelo Tribunal do Tesouro Nacional, órgão colegiado cuja

presidência cabia ao próprio secretário de Estado.

11

O Tribunal era composto

pelo inspetor-geral, o contador-geral e o procurador fiscal. O inspetor-ge-

ral possuía amplas atribuições, era o vice-presidente do Tribunal do Tesouro,

cabendo-lhe a supervisão e fiscalização de todas as repartições que o integra-

vam, subordinando a Secretaria, a Contadoria-Geral, a Tesouraria-Geral e o

Cartório. Além disto, era também responsável pela fiscalização da administra-

ção das rendas nacionais em todo o Império, o que incluía as tesourarias das

províncias, todas as administrações, recebedorias e pagadorias (

brasil

, 1833,

p. 103-127).

No entanto, nas outras secretarias não se verificaram alterações em sua or-

ganização interna, tendo havido somente pequenas mudanças que afetavam,

em geral, suas atribuições. Na verdade, as informações sobre a estrutura das

secretarias de Estado no período são muito escassas, aparecendo na legislação

apenas quando havia a criação de novos cargos. Esta característica evidencia as-

pectos importantes da administração pós-independência, como a manutenção

das estruturas herdadas da administração joanina, mesmo após a Constituição

de 1824. Além disto, verifica-se não apenas uma organização bastante simpli-

ficada, como a inexistência de uma subdivisão interna dos serviços, exceção

feita às pastas da Justiça, Fazenda e Estrangeiros. Assim, como vemos, outra

particularidade da administração imperial neste momento era a inexistência

de padronização na estrutura central das secretarias, salvo o cargo de oficial-

maior, comum a todas. Além do oficial-maior, que dirigia e inspecionava os

trabalhos, no caso da Fazenda, o inspetor-geral ocupava o topo hierárquico. O

quadro de funcionários das secretarias incluía, em geral, oficiais, amanuenses,

porteiros, ajudantes, escrivães e correios.

Uma das áreas mais nevrálgicas na formação do Estado independente, a Fazen-

da sofreu uma série de adequações que tiveram repercussão em sua estrutura

administrativa ao longo da década de 1830, especialmente após o ato adicional

de 1834. O enfrentamento da questão da dívida pública e a redefinição da or-

ganização tributária significaram a distinção das competências das províncias e

do governo central, bem como ajustes nas repartições voltadas para este fim,

num processo que envolveu a extinção e a criação de novos órgãos e as neces-

sárias alterações de competências. No entanto, esta ação não representou o

resultado de um projeto de mudanças estruturais na burocracia imperial, que

a constituísse como um sistema administrativo uniforme e racional, mas antes

uma experiência restrita.

12

Foi em 1833 que se efetuou a primeira tentativa de uma reforma ampla na

administração imperial com a criação, pelo decreto de 12 de junho de 1833,

de uma comissão encarregada de elaborar um projeto de regulamento para

as diversas secretarias de Estado. Justificava-se o estabelecimento da comis-

são pela incapacidade de tais repartições, “montadas no tempo da Monarquia

Pura”, de prestarem o “serviço que se exige dos Governos representativos”

(

brasil

, 1833, p. 85), devendo ser composta pelos oficiais-maiores das secreta-

rias e das câmaras legislativas. Caberia à comissão elaborar um regimento que

regulasse as atividades das secretarias de Estado de forma mais vantajosa ao

serviço público, devendo também determinar o número e a graduação de seus

empregados. Porém, os trabalhos da comissão parecem não ter avançado.

13

Era

necessário um plano geral de reforma já que o orçamento do império, aprova-

do pela lei de 15 de dezembro de 1830, desautorizava que, com exceção dos

empregos dos oficiais-maiores, os lugares vagos fossem preenchidos sem que a

Assembleia Geral regulasse as secretarias.

O decreto n. 60, de 20 de outubro de 1838, que aprovou o orçamento para

o ano financeiro 1839-1840, revogou o artigo 45 da lei de 15 de dezembro

de 1830, autorizando uma organização mais adequada às “exigências do

serviço público” e que marcasse o número de seus empregados e vencimentos

9.

A estrutura tributária e a

reforma que se empreenderam

com as leis de 24 de outubro

de 1832 e de 8 de outubro de

1833 são analisadas em Amed;

Negreiros (2000).

10.

Não trataremos das

ambiguidades envolvendo a

Secretaria de Fazenda, como o

conjunto de órgãos subordinados

ao secretário da Fazenda, e o

Tesouro Nacional como seu

núcleo administrativo. Para esta

discussão, ver

barcelos

, 2014.

11.

Tinham assento no Tribunal

do Tesouro Público o presidente,

o inspetor-geral, o contador-

geral e o procurador fiscal, todos

de nomeação do imperador. O

presidente tinha voto deliberativo

e todos os outros membros do

Tribunal, o consultivo.

12.

Para análise das mudanças

na administração fazendária

ocorridas no período

1822 a 1831,

ver

barcelos

, 2014.

13.

Não foram encontradas

maiores informações sobre os

resultados das atividades da

comissão, mas o relatório de

1834 do secretário do Império,

Joaquim Vieira da Silva e Souza,

informa terem ocorrido vários

problemas durante a preparação

dos trabalhos que pretendiam

elaborar um plano geral a ser

oferecido à Assembleia Geral,

mas não fica claro se ele se

referia à comissão criada

em 1833.