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Colhedor de algodão, 1893
Colhedor de algodão, 1893

O Serviço de Algodão foi criado pelo decreto n. 11.475, de 5 de fevereiro de 1915, com a finalidade de promover o desenvolvimento da cultura algodoeira no país. Suas atribuições envolviam a concessão de auxílios para os produtores, a realização de ações destinadas à disseminação de técnicas de preparação de terreno e plantio, o aperfeiçoamento e a seleção de sementes, o estudo do solo, do clima e das doenças do algodoeiro, entre outras (Brasil, 1917a, p. 289). 

O algodão tornou-se um produto de exportação de destaque da economia colonial, especialmente nos estados da atual região Nordeste, em meados do século XVIII, no contexto das transformações e progressos técnicos decorrentes da Revolução Industrial (Canabrava, 2005, p. 62). Nesse momento, foram iniciadas, pela Coroa portuguesa, medidas de incentivo à sua produção por meio da atuação de companhias de comércio e do estabelecimento de órgãos para o controle e a promoção agrícola e comercial. 

No período imperial, houve uma redução das exportações, que voltaram a crescer no final da década de 1850 e início dos anos 1860, quando o maior país produtor, os Estados Unidos, enfrentava os conflitos internos da Guerra da Secessão (1861-1865). Na década seguinte, ocorreu uma nova queda das vendas para o mercado externo, ao lado de um crescimento gradual do consumo interno, associado ao movimento de expansão das indústrias têxteis, que teve continuidade e foi incentivado após a Proclamação da República, por meio de diversas medidas protecionistas (Abreu; Aranha, s.d., p. 6-10; Franco; Lago, 2011, p. 22-31).

Mas foi somente com a criação do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, em 1906, que o algodão e outros produtos agrícolas tornaram-se objeto da política republicana, apesar do lugar central ocupado pelo café. Os principais obstáculos enfrentados pela cultura algodoeira nessa época estavam ligados ao baixo nível de desenvolvimento das técnicas de cultivo e beneficiamento, à carência de mão de obra, à falta de uma política de crédito agrícola e à dificuldade de transporte para escoamento da produção (Takeya, 1987, p. 67).

Em seus primeiros anos, a pasta priorizou as atividades relacionadas ao aprimoramento da mão de obra e à diversificação e modernização da produção agrícola (Mendonça, 1997, p. 137). Em 1910, o decreto n. 8.319, de 20 de outubro, estabeleceu o ensino agronômico, criando instituições em diferentes níveis de ensino e órgãos destinados a pesquisa e divulgação de métodos de cultura e melhoramento de produtos. Entre estes, destacaram-se as estações experimentais, instaladas em vários estados e dedicadas a estudos para o aperfeiçoamento de cana-de-açúcar, mangabeira, seringueira, fumo e outros produtos.

A primeira estação experimental do algodão foi estabelecida pelo decreto n. 9.803, de 9 de outubro de 1912, no município de Coroatá, Maranhão. Em 1915, pelo decreto n. 11.475, os órgãos voltados para a cultura do algodão passaram a receber orientação técnica do Serviço do Algodão, criado por esse ato. Assim, num momento em que as dificuldades de importação impostas pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918) exigiram medidas governamentais para o desenvolvimento da indústria têxtil (Stein, 1973, p. 360-362), evidenciava-se a importância de desenvolver a cultura do algodão, sua principal matéria-prima.

De acordo com o decreto n. 11.475, o Serviço do Algodão era formado pelo superintendente, um secretário, um auxiliar técnico, dois chefes de culturas, quatro assistentes e outros trabalhadores. O decreto permitiu a contratação de profissionais estrangeiros para o preenchimento dos cargos técnicos, inclusive o de superintendente, que foi ocupado pelo agrônomo norte-americano Edward Green, revelando a ascendência dos Estados Unidos sobre os assuntos relacionados à cotonicultura no país (Takeya, 1987, p. 69).

Inicialmente, os trabalhos do serviço consistiram na aquisição de sementes selecionadas, inseticidas e instrumentos agrícolas dos Estados Unidos (Brasil, 1916, p. 25). O relatório de 1917 menciona apenas algumas medidas realizadas durante a “existência” do órgão, indicando sua provável extinção ou a paralisação de suas atividades (Brasil, 1917b, p. 37; Rangel, 2013, p. 47), não tendo sido encontradas mais informações sobre isso. Nos anos seguintes, os relatórios referem-se à temática do algodão sem qualquer menção ao serviço (Brasil, 1918).

Em 1917, ocorreu, no Rio de Janeiro, a Conferência Algodoeira, promovida pela Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), que defendeu a criação de estações experimentais, usinas de beneficiamento e prensagem nos estados produtores, e condenou a falta de seleção de sementes e outras práticas relativas à cultura do algodão (Rangel, 2013, p. 76).

Um dos principais problemas da produção algodoeira eram as pragas, especialmente a lagarta rósea, que se tornou objeto de atenção do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, a partir do estabelecimento do Serviço de Combate à Lagarta Rósea no Museu Nacional, que incluiu a nomeação de delegados em vários estados (Brasil, 1918, p. 72). Outra medida foi a aprovação do decreto n. 12.957, de 10 de abril de 1918, que fixou providências para evitar a importação de sementes de algodão que não fossem previamente submetidas a expurgo.

Além dos trabalhos realizados na esfera federal, os estados também empreenderam ações para a extinção de pragas, dentro de seus limites orçamentários. Em alguns casos, assumiram a execução das tarefas ligadas à defesa agrícola e ao expurgo de sementes de algodão pertencentes ao governo federal, como ocorreu em São Paulo, de acordo com o decreto n. 13.094, de 10 de julho de 1918 (Brasil, 1918, p. 76-78).

Em 1920, o decreto n. 14.117, de 27 de março, determinou, novamente, a criação do Serviço do Algodão. Este ato definiu como escopo de atuação do serviço, realizado por meio das delegacias e estações experimentais, as atribuições presentes no decreto de 1915, acrescentando como competências a concessão de facilidades para aquisição de máquinas e instrumentos; o fornecimento de informações, aos produtores, sobre os mercados consumidores; a fiscalização das usinas de beneficiamento de algodão; a organização de padrões para sua classificação comercial; a realização de entendimentos com os governos estaduais para estabelecimento de taxas e impostos mais baixos, adoção da classificação comercial definida pelo governo federal, entre outras (Brasil, 1921).

O decreto de 1920 estabeleceu a composição do serviço, que seria formado pelo superintendente, um auxiliar técnico, três inspetores e um escriturário, e determinou a criação de delegacias regionais nos estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, e estações experimentais. O mesmo ato extinguiu as delegacias do Serviço de Combate à Lagarta Rósea, cujo pessoal poderia ser aproveitado pelo Serviço do Algodão.

Em 1921, o decreto n. 15.189, de 21 de dezembro, aprovou o regulamento da defesa sanitária vegetal, conferindo funções específicas ao Serviço de Algodão, e também ao Serviço de Inspeção e Fomento Agrícolas e ao Instituto Biológico de Defesa Agrícola, relacionadas ao controle da circulação e inspeção de plantas, sementes e outros materiais de origem vegetal. O mesmo ato instituiu o Conselho Superior de Defesa Agrícola formado por representantes dessas repartições e pelo consultor jurídico do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio.

Um novo regulamento foi aprovado em 1923 pelo decreto n. 16.122, de 11 de agosto, que teve como propósito a produção e distribuição de ‘boas’ sementes, relegando a um segundo plano a disseminação de métodos de aprimoramento de cultivo. Para tanto, foram criadas as fazendas de sementes, que, em conjunto com as estações experimentais, seriam o “ponto de partida de qualquer ação eficiente em matéria de algodão” (Brasil, (1923b), e transferidos para o interior dos estados os centros administrativos, com intuito de facilitar a comunicação com os produtores.

Esse ato também procurou estabelecer princípios para realização de acordos entre a União e os estados, a fim de evitar os recorrentes conflitos. Conforme indica o relatório ministerial, foi estabelecido um regime de colaboração entre o governo federal e os estados produtores, ficando os serviços da Bahia, Minas Gerais, Pará, Paraíba e Rio de Janeiro a cargo da União, e os de Alagoas, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe sob a responsabilidade dos governos estaduais (Brasil, 1928a, p. 59). Não mencionados no decreto, os cargos de delegados seriam acumulados pelos diretores das estações experimentais dos estados.

Além das pragas, outros problemas enfrentados pelos produtores, vistos, sobretudo, na década de 1920, foram as fraudes na colheita, beneficiamento e enfardamento do algodão, que exigiram medidas como a promulgação do decreto n. 15.900, de 20 de dezembro de 1922, que estabeleceu a classificação comercial do algodão. Essa classificação seria definida por uma comissão composta por representantes da lavoura, da indústria e do comércio do algodão, nomeados pelo ministro e sob a presidência do superintendente do Serviço do Algodão (Brasil, 1923a, p. 20.351).

Em 1925, foi criada uma seção de classificação na Superintendência do Serviço do Algodão, institucionalizada apenas em 1931, pelo decreto n. 20.211, de 14 de julho (Brasil, 1929, p. 158). Essa seção mantinha um curso para formação de classificadores de algodão, que deveriam atuar em todo o país (Brasil, 1928b, p. 59).

Em 1933, em consequência das transformações realizadas no então denominado Ministério da Agricultura pelo governo de Getúlio Vargas, o Serviço do Algodão foi extinto pelo decreto n. 22.416, de 30 de janeiro. As atribuições do órgão foram incorporadas pela Diretoria de Plantas Têxteis, criada pelo decreto n. 22.380, de 20 de janeiro daquele ano.

 

Angélica Ricci Camargo
Jan. 2019

 

 

Fontes e bibliografia

ABREU, Marcelo de Paiva; LAGO, Luiz Aranha Correa do. A economia brasileira no Império, 1822-1889. Rio de Janeiro: Departamento de Economia/PUC-Rio, 2011.

BRASIL. Decreto n. 11.475, de 5 de fevereiro de 1915. Cria o Serviço do Algodão. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 288-291, 1917a. 

______. Decreto n. 14.117, de 27 de março de 1920. Cria o Serviço do Algodão. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 871-883, 1921. 

______. Decreto n. 15.900, de 20 de dezembro de 1922. Aprova o regulamento que estabelece medidas tendentes a coibir as fraudes na colheita, beneficiamento e enfardamento do algodão. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo, Rio de Janeiro, 12 jul. 1923a. Seção 1, p. 20351-20352.

______. Decreto n. 16.122, de 11 de agosto de 1923. Dá novo regulamento ao Serviço de Algodão. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 568- 574, 1923b. 

______. Decreto n. 20.211, de 14 de julho de 1931. Cria, na Superintendência do Serviço do Algodão, uma seção de classificação e estabelece medidas destinadas a uniformizar a classificação do algodão em todas as regiões produtoras dessa matéria prima no território nacional. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 548, 1942.

______. Decreto n. 22.380, de 20 de janeiro de 1933. Dá organização às Diretorias Gerais do Ministério da Agricultura. Coleção de leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 132, 1934a.  

______. Decreto n. 22.416, de 30 de janeiro de 1933. Dá organização às Diretorias Técnicas de que se compõem as Diretorias Gerais do Ministério da Agricultura. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 192, 1934b.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria José Rufino Beserra Cavalcanti no ano de 1916, v. 1. Rio de Janeiro, 1916. Disponível em: https://bit.ly/2Rb0MOl. Acesso em: 3 jan. 2019.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio José Rufino Beserra Cavalcanti no ano de 1917. Rio de Janeiro, 1917b. Disponível em: https://bit.ly/2s6AVb0. Acesso em: 3 jan. 2019.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio João Gonçalves Pereira Lima no ano de 1918. Rio de Janeiro, 1918. Disponível em: https://bit.ly/2F59SER. Acesso em: 3 jan. 2019.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio Miguel Calmon du Pin e Almeida no ano de 1924. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1928a. Disponível em: https://bit.ly/2LQAMS5. Acesso em: 3 jan. 2019.

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______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio Geminiano Lyra Castro no ano de 1926. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1928b. Disponível em: https://bit.ly/2TpBJUk. Acesso em: 3 jan. 2019.

______. [Exposição de motivos do decreto n. 16.122, de 11 de agosto de 1923]. Rio de Janeiro, 1923c. Disponível em: https://bit.ly/2SAm44n. Acesso em: 3 jan. 2019.

CANABRAVA, Alice Piffer. História econômica: estudos e pesquisas. São Paulo: Hucitec; Unesp; ABPHE, 2005.

COSTA, Sérgio Rodrigues; BUENO, Miguel Garcia. A saga do algodão: das primeiras lavouras à ação da OMC. Rio de Janeiro: Insight Engenharia, 2004. 

FRANCO, Gustavo; LAGO, Luiz Aranha Correa do. A economia da República velha, 1889-1930. Rio de Janeiro: Departamento de Economia/PUC-Rio, 2011. 

MENDONÇA, Sônia Regina. O ruralismo brasileiro (1888-1931). São Paulo: Hucitec, 1997.

RANGEL, M. F. O cientista, o museu e a lagarta: Costa Lima e o serviço de combate à lagarta rósea do Museu Nacional. Acervo: Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, v. 26, n. 1, p. 69-80, 2013. Disponível em: https://bit.ly/2TnIcir. Acesso em: 3 jan. 2019. 

TAKEYA, Denise Monteiro. A modernização agrícola na expansão da cotonicultura no Rio Grande do Norte (1880-1915). Ciência & Tropico, Recife, v.15, n. 1, p. 65-71, jan./jun. 1987. Disponível em: https://bit.ly/2SEBG7a. Acesso em: 3 jan. 2019.

STEIN, Stanley J. Período áureo da indústria manufatureira de tecidos de algodão no Brasil. In: INSTITUTO BRASILEIRO DO CAFÉ.   Ensaios sobre café e desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro, 1973. p. 351-378.

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados no seguinte fundo do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

 

Referência da imagem

Gerard Beekman. Colhedores de algodão, Rio de Janeiro, Brasil, 1893. Arquivo Nacional, Coleção Privilégios Industriais, BR_RJANRIO_PI_1156

 

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