

Cadernos Mapa n. 3 ▪ Entre caminhos e descaminhos
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passo gigantesco na luta contra a inflação (…). Tudo isso, Senhores
Congressistas, possui como premissa maior uma estratégia global de
reforma do Estado. (MELLO, 1990, p. 14)
A lógica por trás dessas palavras é bastante simples. A inflação não era um fenômeno
que afetava apenas a economia do país, mas sim toda a sociedade, dado seu caráter punitivo
em relação às classes mais baixas, as que mais sofriam com o aumento acelerado dos preços.
No entanto, para Collor e sua equipe, a raiz do problema inflacionário se encontrava no
elevado déficit público, o que, como bem sintetizou Gustavo Alves (2004, p. 133), fazia a
questão girar em torno da equação: Estado esbanjador = inflação = injustiça = imoralidade. A
inflação, portanto, era um mal que deveria ser expugnado e isto só poderia ser feito com
sucesso se fosse a partir de uma ampla reforma do Estado.
Ainda no discurso de posse, o presidente deixa claro o rompimento com o modelo
econômico das décadas anteriores, ao dizer que:
A dura verdade é que, no Brasil dos anos oitenta, o Estado não só
comprometeu suas atribuições, mas perdeu também sua utilidade histórica
como investidor complementar. O Estado não apenas perdeu sua capacidade
de investir como, o que é ainda mais grave, por seu comportamento errático
e perverso, passou a inibir o investimento nacional e estrangeiro (…). Essa
perversão das funções estatais – agravada por singular recuo na capacidade
extrativa do Estado – exige que se redefina, com toda a urgência, o papel do
aparelho estatal entre nós. Meu pensamento, neste ponto, é muito simples.
Creio que compete primordialmente à livre iniciativa – não ao Estado – criar
riqueza e dinamizar a economia. Ao Estado corresponde planejar sem
dirigismo o desenvolvimento e assegurar a justiça, no sentido amplo e
substantivo do termo. O Estado deve ser apto, permanentemente apto a
garantir o acesso das pessoas de baixa renda a determinados bens vitais.
Deve prover o acesso à moradia, à alimentação, à saúde, à educação e ao
transporte coletivo a quantos deles dependam para alcançar ou manter uma
existência digna, num contexto de iguais oportunidades – pois outra coisa
não é a justiça, entendida como dinâmica social da liberdade de todos e para
todos. (…) Entendo assim o Estado não como produtor, mas como promotor
do bem-estar coletivo. Daí a convicção de que a economia de mercado é
forma comprovadamente superior de geração de riqueza, de desenvolvimento
intensivo e sustentado. (MELLO, 1990, p. 15)
O trecho citado é um tanto longo, mas a clareza com que o próprio presidente propõe
o rompimento com o modelo anterior de Estado nos parece mais significativa do que qualquer
análise. Vale dizer que, neste primeiro momento, a administração pública era um dos principais
eixos sobre os quais se apoiavam as propostas do governo Collor. O presidente anunciou, desde
o seu primeiro dia no cargo, a necessidade de serem feitas três reformas: tributária,
patrimonial e administrativa. Sobre a última, afirmou ainda: