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tal conjuntura decorre uma das implicações mais importantes na identificação e

compreensão dos mecanismos sociopolíticos que estamos interessados em estudar: a

indefinição entre os limites do público e do privado, constante na constituição do

império português (Gouvêa, Frazão, Santos, 2004, p. 97), e motivo de debate entre

historiadores.

3

Laura de Mello e Souza, entretanto, ressalva que as análises de Hespanha são

válidas, sobretudo para os séculos XVI e XVII, sendo problemática para a apreensão

do século XVIII, quando há mudança no equilíbrio político no governo de d. João V e

na gestão pombalina (Souza, 2006, p. 49). A seu ver, o autor se descuida quando

aborda o tema nos domínios ultramarinos, não levando em consideração as diferenças

entre as muitas regiões que abarcava, principalmente a América (Souza, 2006, p. 50).

As fontes utilizadas por Hespanha, de acordo com a autora, também são

problemáticas, visto que o autor se ampara muito em textos jurídicos e teológicos para

argumentar a existência de limitadores ao poder régio. Não leva em consideração que

muitas normas viravam letra morta e que o Antigo Regime poderia ser caracterizado

por uma “regra rígida” e uma “prática flácida” (Souza, 2006, p. 56). Entretanto,

devemos levar em consideração que Hespanha, já em 2001, ressaltava que o mundo

administrativo português era um “universo fluido”, sobretudo no mundo ultramarino,

onde o modelo “juridicionalista” de governo não era dominante e sim “o modelo

„militar‟, „econômico‟ e „comissarial‟ dependentes do arbítrio régio, das soluções

casuísticas contidas nos regimentos ou mesmo nas instruções orais ou por carta

cerrada” (Hespanha, 2007b, p. 9).

Seja como for, é inegável a contribuição de Hespanha para a renovação das

análises acerca das relações entre Portugal e as diversas partes do seu império. A

“tirânica distância” existente entre regiões, conforme as palavras de Russel-Wood,

favorecia um maior desprendimento da autoridade central, “colocando uma

excepcional responsabilidade sobre os ombros do „homem no local‟ cada vez que era

preciso tomar decisões, em geral depois de uma consulta aos principais cidadãos e

3

Para uma breve introdução a esse debate, ver Wehling, Wehling, 1994, p. 299.