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Entretanto, podemos afirmar que as hostilidades regionais ao programa brasileiro estavam
quase todas concentradas na Argentina.
9
A imprensa daquele
país, com o
jornal
La Prensa
à
frente, fazia uma sonora campanha de alerta sobre os navios encomendados pelo Brasil – que
seriam muito mais poderosos que os argentinos – e os planos hegemônicos brasileiros.
10
As
negociações diplomáticas entre os dois países foram tensas, não faltando, inclusive, planos para
um ataque e ocupação do Rio de Janeiro por tropas argentinas, caso o Brasil não cedesse nas
negociações
11
(DORATIOTO, 2000, p. 139-140). Mesmo quando os ânimos regionais foram
pacificados, a Argentina continuou sua corrida armamentista: em 1908 foi apresentado ao
Congresso argentino, pelo Poder Executivo daquele país, um projeto de lei de armamentos navais
que se converteu na lei 6.283, de 17 de dezembro de 1908. Esse foi o marco legal que possibilitou
à Argentina a aquisição dos encouraçados
Rivadavia
e
Moreno
, assim como outros navios de
guerra de menor porte, que chegariam às águas em 1915. Esses navios eram maiores que os
brasileiros, além de mais modernos e tecnicamente superiores. (DI BIASSI, 2010; DI MARTINI,
2014, p. 323; MARTINS FILHO, 2010, p. 164-165).
Tendo como pano de fundo o ímpeto da marinha brasileira de alcançar a supremacia
regional, Alexandrino Faria de Alencar, ministro da Marinha pela segunda vez, tentou utilizar o
programa naval argentino como pretexto para encomendar um terceiro encouraçado
dreadnought
, denominado
Rio de Janeiro
, maior e mais poderoso que os do país vizinho.
9. Embora o Chile também buscasse aumentar o seu poderio naval nessa conjuntura, podemos afirmar que o
programa brasileiro, pelo menos aparentemente, não lhe causava receios. Tal fato pode ser revelado pelo testemunho
do representante britânico na cidade de Santiago, que, em comunicado a Londres, declarou que o ministro da Guerra
e Marinha chileno, Francisco Herboso, não encarava as aquisições brasileiras com preocupação. O mesmo fora dito
pelo ministro aos diplomatas ingleses no Rio de Janeiro. Entretanto, o ministro chileno também afirmara que seu país
buscaria aumentar o poder de sua armada se os argentinos também o fizessem (MARTINS FILHO, 2010, p. 163).
10. A imprensa argentina não era a única que fazia alarde sobre os navios brasileiros. Os demais países focavam suas
preocupações sobre a possibilidade de revenda dos navios para uma potência maior, o que poderia desestabilizar o
equilíbrio naval e armamentista mundial, do que nos possíveis planos hegemônicos do Brasil. As suposições acerca de
um segundo comprador dos navios brasileiros somente foram perder intensidade quando o governo brasileiro, em
1909, encomendou aos estaleiros Vickers e Armstrong a construção das docas flutuantes para a recepção do
dreadnought Minas Gerais
(MARTINS FILHO, 2010, p. 144-151).]
11. No dia 10 de junho de 1908, o ministro das Relações Exteriores Zeballos apresentou um plano militar secreto ao
então presidente argentino José Figueiroa Alcorta, que deveria ser implementado caso o Brasil se recusasse a ceder
um dos dreadnoughts que encomendara para a Argentina, em nome do equilíbrio naval da região. Tal plano consistia
na mobilização da esquadra argentina, assim como de 50 mil reservistas do exército, cogitando, inclusive, a
possibilidade de um ataque e ocupação da cidade do Rio de Janeiro. Entretanto, tal plano vazou para a imprensa, de
modo que o oposicionista jornal La Nacion o publicou, mobilizando a opinião pública e a reação de grupos políticos
favoráveis a um entendimento diplomático com o Brasil. A diplomacia britânica, que não via com bons olhos o barril
de pólvora prestes a explodir na região, também agiu de forma velada contra Zeballos, por considerá-lo tumultuador
da paz regional. A soma de todos estes elementos contrários ao ministro ocasionou a sua queda no Ministério das
Relações Exteriores (DORATIOTO, 2000, p. 140).