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Cadernos Mapa n. 2 ▪ O Império brasileiro e a Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça

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Geral as atribuições de fazer, interpretar, suspender e revogar leis (p. 39). Isto, ao lado

da prática recorrente do Executivo de questionar as decisões do Judiciário, chegando

mesmo a forçar sua modificação punindo magistrados (p. 36-37), inviabilizava a

constituição do Judiciário enquanto poder autônomo. Ao que foi dito, precisamos

acrescentar que a prerrogativa de interpretar as leis conferida ao Legislativo pela

Constituição não foi, durante todo o Império, praticada de fato por este poder, sendo,

então, “absorvida pelo Executivo” (p. 39). O melhor exemplo da interferência do

Executivo nas decisões dos magistrados e do desrespeito pelos princípios fundamentais

da independência do Judiciário aconteceu em 1854, durante a gestão de Nabuco de

Araújo como secretário da Justiça, quando foram determinadas a aposentadoria de

dois juízes e a transferência de mais um do Tribunal da Relação de Pernambuco devido

à absolvição de indivíduos acusados de envolvimento com o tráfico ilegal de africanos,

decisão da qual o Executivo discordava. Fatos semelhantes ocorreram nos ministérios

de Honório Hermeto Carneiro Leão Paraná e João Lins Vieira Cansansão de Sinimbu (p.

36).

Outro caso em que o Poder Executivo, durante o Império, extrapolou seus

limites usuais foi a atribuição conferida à Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça

de administrar a organização eclesiástica, função que conservará até 1862, quando foi

transferida ao Ministério do Império.

Essa tutela do Estado sobre a Igreja deveu-se à

reprodução no Brasil de uma “tradição regalista portuguesa” (Lacombe; Tapajós, 1986,

p. 108) fundamentada legalmente pela Constituição de 1824, que conferia ao

Executivo a prerrogativa de validar os decretos eclesiásticos, e reforçada por inúmeras

portarias que firmaram o controle estatal sobre a formação e nomeação dos membros

da Igreja até os postos mais altos.

Para além das medidas que vinculavam a administração eclesiástica ao Estado,

o trabalho do ministério no Primeiro Reinado se concentrou em questões como a

normalização da entrada e permanência de portugueses remanescentes após a

independência; o funcionamento da magistratura; o controle da imprensa e a

repressão da criminalidade, sendo que nesse aspecto sua ação se pautou, em grande

parte, pelo controle da população negra, entendida como raiz do problema.

A historiografia recente tende a confirmar o papel da Secretaria de Justiça

como mantenedora da ordem ao longo de todo o período imperial, condição necessária

para a constituição do Estado nacional idealizado pelas elites no poder, ou seja, um

organismo voltado para a defesa dos interesses da agricultura escravista e a

manutenção das diferenças no seio da própria classe senhorial, num contexto social