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apresentasse o melhor preço. No entanto, o ministro enviou uma circular aos estaleiros
informando que gostaria de ter mais propostas além das que recebera. O objetivo dessa circular
era o resguardo de Júlio César de Noronha frente às críticas ao programa que começavam a surgir
na Marinha. Assim, ele buscava demonstrar a solidez e a coerência do programa através do
testemunho dos fabricantes estrangeiros (MARTINS FILHO, 2010, p. 79).
O contrato para a construção dos encouraçados de acordo com as especificações do
governo brasileiro foi assinado em 23 de julho de 1906 com a firma
Sir W. G. Armstorng
Whitworth and Co., Limited
. Embora todo esse processo pareça ter seguido os trâmites clássicos
da livre concorrência liberal, alguns importantes detalhes foram obscurecidos pelas narrativas
mais tradicionais da história naval brasileira.
Primeiro, o desenho dos navios encouraçados já estavam finalizados na Inglaterra antes
mesmo da apresentação e da aprovação do projeto encabeçado pelo ministro no Legislativo
(MARTINS FILHO, 2010, p. 82-88). Tal fato, se não dá a certeza, pelo menos levanta uma grande
suspeita de que os desenhos e detalhes do programa, na realidade, foram concebidos nos
arsenais ingleses, sendo a apresentação na Câmara e no Senado apenas uma formalidade
necessária. É interessante observar também que o ministro Noronha já conhecia as medidas
exatas dos navios desde, pelo menos, agosto de 1903, um ano antes de apresentar o programa
naval à aprovação do Poder Legislativo. Maior prova disso é um documento expedido para o
inspetor do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, que era também irmão do ministro, em que
solicitava um projeto e orçamento de obras necessárias para o aumento de um dique da Ilha das
Cobras com capacidade de receber navios com as dimensões dos encouraçados encomendados
pelo governo brasileiro. Em segundo lugar, as prováveis propinas pagas pela indústria
armamentista para facilitar a negociação com o governo. Em outubro de 1906, um documento da
diplomacia inglesa, por exemplo, expressava que “interesses privados pessoais jogaram papel
importante na encomenda dos navios, que jamais teria sido conseguida não fossem os enormes
pots-du-vin
generosamente distribuídos às mais altas autoridades navais e outras personagens
envolvidas” (apud MARTINS FILHO, 2010, p. 84).
Nesse sentido, apesar de todos os discursos existentes nos relatórios ministeriais acerca da
transparência com que o Programa Naval de 1904 foi concebido e estabelecido, é inegável a
existência de alguns pontos turvos em seu processo. Ainda mais quando focamos as lentes nas
negociações entre o governo e os estaleiros estrangeiros, que, em tese, deveriam ser baseadas na
livre concorrência liberal. Contudo, os fatos que as recentes pesquisas trazem cada vez mais